terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

As duas Formas do Rito Romano: “Enriquecimento Mútuo” na teoria e na prática

“Fala-se muito de ‘Reforma da Reforma’ e de enriquecimento da ‘Forma Ordinária do Rito Romano’ pela ‘Forma Extraordinária’, porém, na prática, o que acontece? Este artigo responde a pergunta (ML)”



Resumo:

Até que ponto as orações e ações cerimoniais do usus antiquior podem ser usadas na celebração da Missa com o Missal de Paulo VI? Exemplos de alguns elementos utilizados pelo Arcebispo Ranjith e pelo Papa Bento XVI parecem contradizer na prática a ideia de que tal enriquecimento seja proibido. Um texto do jornal Notitiae, da Sagrada Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos, geralmente citado como sendo uma instrução que desencorajaria o uso de elementos tradicionais, é analisado e considerado inconclusivo, especialmente à luz do Summorum Pontificum, considerado em termos de sua aplicação à celebração da forma nova da Missa. O desenvolvimento da forma nova da Missa pela adição de elementos do usus antiquior é distinguido da deformação arbitrária da Liturgia e da imposição dos caprichos pessoais do sacerdote. Alguns possíveis desenvolvimentos práticos futuros são apresentados.

Em 2008, em visita a Maria Vesperbild, um local de peregrinação mariano na Bavária, o Arcebispo Malcom Ranjith, então Secretário da Congregação para o Culto Divino, celebrou a Missa principal no santuário na Festa da Assunção da Bem-aventurada Virgem Maria. A solenidade da celebração foi percebida, incluindo o fato de que vestimentas de alta qualidade foram usadas (incluindo túnica e dalmática pontifical), a Missa foi celebrada ad orientem, e o Arcebispo referiu-se em seu sermão à importância para os fiéis do senso de sacralidade na celebração da Missa. Apesar de ser talvez mais importante observar em geral que o Arcebispo celebrou a Missa reverentemente e com a devida solenidade, gostaria de destacar um detalhe que foi observado por Gregor Kollmorgen, um dos editores gerais do website New Liturgical Movement:

“Muito interessante, Mons. Ranjith genuflectiu após a transubstanciação de ambas as espécies, e também após a elevação das mesmas, como sempre é feito na forma antiga do rito Romano, o que certamente é uma maneira de sublinhar e reverenciar a Presença Real”.[i]

Não só a atual Instrução Geral ao Missal Romano especifica que há três genuflexões durante a Missa, “a saber: depois da apresentação da Hóstia, após a apresentação do cálice e antes da Comunhão”[ii], mas a redução do número de genuflexões na consagração de duas para uma “após a elevação da Hóstia e após a elevação do cálice” foi introduzida no processo de simplificação que aconteceu antes da revisão completa do Missal em 1970.[iii]

Um exemplo similar de prática litúrgica que parece contradizer as prescrições detalhadas da reforma litúrgica pós-conciliar pode ser observada na maneira como o Papa Bento XVI tem celebrado a Missa em várias ocasiões. Ao incensar o altar no Ofertório, pode ser visto nas tomadas fechadas das câmeras de televisão que ele está dizendo as palavras do Salmo 140 que eram tradicionalmente rezadas nesse momento. Não só o novo Missal Romano omite essas orações, mas uma resposta dada no jornal Notitiae, de 1978, abordou especificamente a questão. A pergunta levantava a questão de diversas práticas que estavam sendo usadas para incensar o altar em um Missa mais solene no novo Rito (naturalmente isso foi considerado como um problema significante na época). Alguns estavam incensando o altar de maneira simples e direta enquanto outros estavam usando os ritos prescritos na versão anterior do Missal. A resposta foi a seguinte:

“Quando as rubricas do Missal de Paulo VI nada ou pouco disserem sobre questões particulares em alguns pontos, não se deve inferir que o rito anterior deva ser observado. Logo, os gestos múltiplos e complexos para incensação conforme prescritos no Missal antigo não devem ser repetidos.”[iv]

Essa resposta vem sendo utilizada há muito tempo para justificar a oposição a qualquer uso de elementos antigos na celebração da nova forma da Missa. Logo, precisamos considerar sua significância antes de fazermos quaisquer sugestões que possam parecer contradizê-la. Em primeiro lugar, a resposta é estruturalmente um non sequitur. Ela declara que quando o Missal de Paulo VI silencia, a conclusão a ser tirada não pode ser que “se tenha que seguir” ou “se deva observar” (oporteat servare) o rito antigo. Daí ela conclui que os “gestos múltiplos e complexos” não devem ser repetidos (non sunt iterandi). Obviamente outra possibilidade abre-se para nós, a saber: ainda que os gestos antigos não tenham que ser seguidos, eles não estão, apesar disso, proibidos. Se a resposta dada no jornal Notitiae deve ser considerada de um ponto de vista legalista, pode-se insistir simplesmente que uma lei dúbia não vincula.

Em segundo lugar, a resposta, se seguida ao pé da letra, leva a conclusões absurdas. Para dar apenas um exemplo, o Ritus Servandus para o usus antiquior dá instruções a respeito de como o sacerdote deve vestir a alva em preparação para a Missa: “Veste-se a alva, baixando a cabeça, e em seguida a manga direita no braço direito e a manga esquerda no braço esquerdo”.[v] A Instrução Geral ao Missal Romano fala de itens a serem preparados para a Missa, e inclui a alva, a estola e a casula, dizendo que amito e cíngulo devem ser usados com a alva “a não ser que, devido à forma da alva, não sejam exigidos.[vi] A Instrução silencia sobre qual braço o sacerdote deve por em qual manga. Logo, se a resposta do Notitiae citada acima é para ser aplicada restritivamente a todos os casos onde o Missal de Paulo VI silencia sobre uma questão que foi especificada no antigo Ritus Servandus, sacerdotes ao celebrarem a forma nova da Missa deveriam vestir sua alva de trás para frente.

Embora cada uma dessas objeções possa parecer perspicaz a seu modo, nem o argumento legalista nem o reductio ad absurdum, oferecem uma conclusão satisfatória para algo provável de se tornar uma questão cada vez mais importante, ainda por cima com exemplos de pessoas como o Arcebispo Ranjith e o Papa atual. A questão levantada e respondida no Notitiae em 1978 adquire uma nova significância após o Summorum Pontificum e a importante carta do Papa Bento XVI aos Bispos do mundo, que acompanha o Motu Proprio. O texto central daquela carta é agora bem conhecido daqueles que incentivam a celebração do usus antiquior, mas também tem relevância para a celebração da forma nova. Por isso arrisco citá-lo mais uma vez:

“Não existe nenhuma contradição entre uma edição e outra do Missale Romanum. Na história da Liturgia há crescimento e progresso, mas nenhuma ruptura. Aquilo que para as gerações anteriores era sagrado permanece sagrado e grande também para nós, e não pode ser de improviso totalmente proibido ou mesmo prejudicial. Faz-nos bem a todos conservar as riquezas que foram crescendo na fé e na oração da Igreja, dando-lhes o justo lugar”.[vii]

Se aplicarmos esse texto à celebração da forma nova do rito Romano, além de simplesmente aplicá-lo à celebração do usus antiquior, surge um número de pontos relevantes que se opõem a uma atitude que se enraizou por quarenta anos de celebração da forma nova da Missa. Em primeiro lugar, apesar de ter havido algumas grandes simplificações introduzidas no Missal de Paulo VI, essas não podem ser vistas em contradição com os gestos mais solenes e complexos do usus antiquior. Em outras palavras, se um sacerdote genuflecte duas vezes, tanto na consagração da hóstia como na do cálice, ou se ele incensa o altar com os ditos “gestos múltiplos e complexos” enquanto silenciosamente recita os primeiros quatro versículos do Salmo 140, isto não pode ser visto como algo que desrespeita o novo rito, o Concílio Vaticano II ou a “abertura das janelas” da Igreja: “Não existe nenhuma contradição entre uma edição e outra do Missale Romanum”.

Em segundo lugar, os gestos tradicionais podem ser vistos não apenas como algo não contraditório à celebração de acordo com o Missal de Paulo VI, e mais ainda do que simplesmente estando em harmonia com ele: eles devem ser considerados parte do que é “sagrado e grande” tanto para as gerações passadas como para nós. Em terceiro lugar, há que se levantar a questão acerca do alcance da expressão utilizada pelo Papa Bento XVI ao dizer que tais elementos tradicionais da Liturgia Romana não podem ser de improviso proibidos ou mesmo prejudiciais. Da maneira como o próprio Papa celebra a Missa, parece que Bento XVI aplicaria isso a pelo menos alguns elementos tradicionais a serem usados na nova forma, assim como à negação de quaisquer restrições no uso do Missal pré-conciliar em sua inteireza.

Uma indicação ulterior pode ser encontrada na declaração formal feita no primeiro artigo do Summorum Pontificum. Lá, o Papa Bento XVI estabelece: “Estas duas expressões da Lex orandi da Igreja não levarão de forma alguma a uma divisão da Lex credendi da Igreja; são, de fato, dois usos do único Rito Romano”.[viii] Ao estabelecer que as duas formas são dois usos do único Rito Romano, o Papa faz com que a Igreja evite o problema de sacerdotes ou mesmo paroquianos do rito Romano serem potencialmente “bi-rituais”, com todos os problemas canônicos que isso poderia envolver. A importância da declaração para nossos propósitos reside no fato de que “usos” são menos claramente distintos do que “ritos separados”. No crescimento e progresso que acontecem sem ruptura na história da Liturgia, diversos usos desenvolveram-se como parte de um mesmo rito. No curso daquela história, com a mudança acontecendo de forma gradual, um costume local levou muitas vezes, pouco a pouco, a um uso local. Logo, o uso de gestos e orações tradicionais do Missal anteriormente em uso geral não solapa necessariamente o Missal de Paulo VI, mas pode ser visto como parte de sua genealogia histórica e, por essa razão, não contraditório a ele, nem prejudicial a seu desenvolvimento orgânico gradual.

De fato, durante os anos que se seguiram à introdução do Missal de Paulo VI, tentativas de impor uniformidade absoluta mostraram-se ilusórias. Muito propriamente, a Santa Sé interveio para condenar abusos litúrgicos que iam desde o uso de textos não bíblicos para as leituras, até a consagração de uma jarra de vinho em lugar de um cálice, passando pelo uso de matérias e formas inválidas para os sacramentos.[ix] Mesmo diante dessas várias declarações formais, muitos detalhes continuam largamente ignorados: muitos monastérios continuam a consagrar as sagradas espécies em uma jarra, ministros extraordinários continuam a receber a Sagrada Comunhão ao mesmo tempo em que o sacerdote celebrante em algumas paróquias, vários textos do Missal e do Lecionário são substituídos por outros, e o povo reza orações que são reservadas para o sacerdote.

Poder-se-ia argumentar que, se as normas litúrgicas fossem seguidas, a desejada uniformidade da celebração seria alcançada, mas novamente isso é ilusório. Não se devem fechar os olhos para o fato de que a introdução do vernáculo introduziu uma diversidade na celebração litúrgica que é mais ampla em seu impacto nos fiéis do que a diferença entre, por exemplo, o Uso de Sarum e o Missal de São Pio V. No próprio mundo de língua inglesa, usando-se a mesma tradução do Missal, há grandes divergências entre o que o povo experimenta ao ir de uma igreja para outra em uma Missa Dominical, mesmo dentro de uma mesma cidade. Opor-se ao uso de gestos e orações tradicionais no Missal de Paulo VI com base em uma desejada uniformidade tem pouca credibilidade no contexto da radical diversidade que já existe em sua celebração. As orações e gestos tradicionais tenderiam, de fato, a uma maior uniformização na prática.

Na carta que acompanhou o Summorum Pontificum, o Papa Bento XVI disse que uma das razões pelas quais alguns dos fiéis desejariam “reaver a forma da Sagrada Liturgia que lhes era cara” era a dor profunda causada por “deformações arbitrárias na Liturgia”. O Papa João Paulo II chegou a ir além, ao fazer um pedido de perdão aos fiéis:

“Ao chegar ao fim dessas considerações, gostaria de pedir perdão em meu próprio nome e em nome de todos vós, veneráveis e queridos irmãos no episcopado, por tudo que, por qualquer razão, devido a qualquer fraqueza, impaciência ou negligência humana, e também devido à aplicação parcial, tendenciosa e errônea das diretrizes do Concílio Vaticano II, possa ter causado escândalo e distúrbio no que concerne à interpretação da doutrina e da veneração devida a este grande sacramento”.[x]

Na mesma carta, o Papa João Paulo II também condenou o individualismo da parte de sacerdotes ao celebrarem a Missa, e a ideia de que o sacerdote é o “proprietário” da Liturgia e pode marcá-la com seu estilo pessoal.[xi] Assim surge a questão: um sacerdote que venha a usar elementos verbais ou ações da forma antiga da Missa estará promovendo uma “deformação arbitrária” ou impondo seu estilo pessoal? Deve-se olhar para isso da mesma forma que se olha para abusos litúrgicos? Já argumentei que o uso de elementos tradicionais na forma nova da Missa pode ser visto como parte daquele crescimento contínuo e orgânico a que o Papa Bento XVI se referiu na carta que acompanha o Summorum Pontificum; logo, certamente não se trata de uma “deformação”. Também é importante notar que o uso de tais elementos não é um exercício de capricho pessoal por parte do sacerdote celebrante; em vez disso, trata-se do uso de cerimônias e orações que fizeram parte da vida da Igreja por séculos e que, mais recentemente, tiveram sua execução definida de maneira tão exata a ponto de os reformadores litúrgicos considerarem-nas muito rígidas, muito alheias ao engajamento pessoal e oferecendo muito pouco espaço para criatividade. Eles são precisamente o oposto do que seria uma imposição de um estilo pessoal na Sagrada Liturgia.

Permitam-me concluir oferecendo algumas sugestões a respeito de como isso poderia funcionar na prática para um sacerdote que celebre a forma nova do rito Romano em uma paróquia. Classifiquei as sugestões em quatro categorias possíveis e ofereço alguns exemplos em cada caso.



Elementos que são perfeitamente consoantes com as novas rubricas

Quando as rubricas do Missal de Paulo VI instruem o sacerdote a fazer uma reverência, elas nem sempre especificam como essa reverência deve ser feita, o que pode levar a idiossincrasias que, apesar de bem intencionadas, não deixam de ser imposições pessoais na celebração da Missa. Não é incomum que sacerdotes devotos deem um passo atrás no altar e façam uma profunda reverência às palavras “In spiritus humilitatis [...]”, que são incluídas no Ofertório da forma mais nova da Missa.[xii] Esse gesto bem intencionado de devoção provavelmente não causa mal a ninguém, ainda que seja considerado algo singular e uma irregularidade na celebração do usus antiquior. Em tais casos, um sacerdote familiarizado com as rubricas da forma antiga poderia observá-las na forma nova sem haver necessidade de qualquer disputa. A forma antiga poderia dar direção nesses pontos onde não há direcionamento algum na forma nova. Considerações similares poderiam ser feitas no caso de outros gestos rituais, tais como a maneira como o sacerdote junta ou estende suas mãos.

Vale a pena também observar que sacerdotes omitem rotineiramente várias reverências que são prescritas na Instrução Geral: “Uma reverência com a cabeça é feita quando as três Pessoas Divinas são nomeadas em conjunto e aos nomes de Jesus, da Bem-aventurada Virgem Maria, e do Santo em honra de quem a Missa está sendo celebrada”.[xiii] Sacerdotes que aprenderam a celebrar a forma antiga da Missa tendem a observar essa instrução quando celebram a forma nova. Este é um exemplo claro do mútuo enriquecimento que o Papa Bento XVI encorajou, de que sacerdotes familiarizados apenas com a forma nova poderiam se beneficiar.



Elementos que podem ser introduzidos sem distúrbio

Várias das orações silenciosas que são parte da forma antiga do rito Romano poderiam ser facilmente introduzidas pelo sacerdote sem qualquer distúrbio aos fiéis, e em muitos casos sem que ninguém perceba, exceto uma minoria na assembleia que poderia estar familiarizada com o usus antiquior (e que ficaria deliciada). Sob uma visão estrita da lei litúrgica, alguém poderia argumentar que essas orações são usos inofensivos “praeter legem” ou poderia simplesmente conceder que seja legítimo usá-las tendo como base o que argumentei acima.

Temos visto um exemplo do uso que o Santo Padre faz das orações durante a incensação do altar no Ofertório. Sacerdotes sem experiência com a forma antiga não conheceriam necessariamente essas orações; mas muitos sacerdotes jovens e devotos ficariam felizes em aprendê-las e dizê-las silenciosamente. Outros exemplos seriam: as orações ao vestir-se antes da Missa, o Aufer a nobis no caminho para o altar, o Oramus te ao beijar o altar e o Placeat tibi durante o silêncio após a comunhão ou no retorno à sacristia. Esses elementos enriqueceriam genuinamente o Novus Ordo para muitos sacerdotes. Eles também enriqueceriam o rito per accidens para os leigos por estarem contribuindo para a devoção do sacerdote e para a ars celebrandi.



Elementos que poderiam ser justa e facilmente permitidos

Nas rubricas da terceira edição do Missal Romano, o sacerdote é instruído a segurar a patena ligeiramente acima do altar “dizendo em voz baixa” as palavras “Bendito sejais vós, Senhor Deus de toda a criação”. Uma rubrica ulterior instrui: “Se, entretanto, o canto de Ofertório não é cantado, o sacerdote pode falar essas palavras em voz alta; no final, o povo pode aclamar: ‘Bendito seja Deus para sempre’”. Logo, a primeira opção, de acordo com o Missal de Paulo VI, é que as orações do Ofertório sejam ditas silenciosamente pelo sacerdote.[xiv] Isso provê em si mesmo um exemplo de como a familiaridade com a forma antiga pode enriquecer a celebração da forma nova. Quando, em uma Missa sem canto, o sacerdote diz as orações do Ofertório silenciosamente, é provável que o povo estranhe e fique imaginando o que está acontecendo. Gradativamente eles se acostumarão com o fato de que muita coisa pode estar “acontecendo” sem que o sacerdote tenha que dizer palavras ao microfone.

A substituição das orações do Ofertório foi uma das mudanças mais radicais feitas no Missal de Paulo VI. Seria possível, dentro do contexto da celebração da forma nova, permitir que as orações antigas do Ofertório sejam ditas. Similarmente, as várias genuflexões e gestos rituais (principalmente os sinais da cruz) que faziam parte do Cânon Romano poderiam ser permitidos sem qualquer distúrbio aos fiéis. Esses elementos do usus antiquior teriam um impacto psicológico menor do que celebrar a Missa em latim ou celebrá-la ad orientem, que são procedimentos inteiramente legítimos dentro da forma nova. É difícil pensar em uma razão convincente para proibi-los considerando o enriquecimento que eles trariam à celebração da forma nova.

Uma concessão que teria um impacto maior do que usar silenciosamente as orações antigas do Ofertório e os gestos tradicionais durante o Cânon seria permitir que o Cânon fosse dito silenciosamente. Isso foi sugerido pelo Cardeal Ratzinger, que disse:

“Não é mesmo verdade que só a recitação [em voz alta] da oração eucarística completa e não interrompida seja condição para a participação de todos nesse ato central da celebração eucarística. [...] Quem teve uma vez a experiência de estar em [uma] Igreja reunida numa oração do Cânon silenciosa, compreendeu o que é o silêncio pleno; ele é aclamação – alta e emocionante – a Deus e oração cheia do Espírito Santo. Aqui, todos rezam juntamente o Cânon, mesmo sendo um compromisso com a Ordem particular do serviço sacerdotal. ”[xv]

O Cardeal Ratzinger relatou em sua sugestão, feita em 1978, que as primeiras palavras de cada oração pudessem ser ditas em voz alta como uma “dica” para a assembleia em favor de sua própria meditação. Apesar de essa sugestão poder ser uma opção (juntamente com aquela de dizer toda a Oração Eucarística em voz alta), o Cânon silencioso com seus gestos tradicionais liberaria o sacerdote da exigência de proclamar textos em voz alta durante a maior parte da Missa, e liberaria o povo de ser implicitamente persuadido a prestar mais atenção na proclamação do que nas próprias palavras ou no conteúdo da Actio Dei que está acontecendo naquele momento.



Desenvolvimentos possíveis a longo prazo

Se adicionássemos às sugestões acima opções para as orações ao pé do altar, e a restauração da ordem das orações na comunhão do sacerdote, alguns poderiam argumentar que pouca coisa sobraria para distinguir a forma nova do rito Romano da forma antiga. Se isso seria de fato uma desvantagem ou se apresentaria um problema inteiramente diferente é uma questão para outro debate e mais amplo; mas de fato haveria ainda muita diferença: as orações e ciclo de leituras foram radicalmente mudados e poderia haver propostas para permitir esses também, mas neste ponto realmente chegamos a uma questão completamente diferente. A legitimidade de celebrar a Missa de acordo com o usus antiquior é agora inquestionável. Deveria ser permitido celebrá-la em vernáculo? Do ponto de vista daqueles que há muito estão vinculados à forma tradicional da Missa, tal sugestão poderia parecer uma ameaça ao uso do latim, que tem sido uma parte significante desse vínculo.

Se olharmos para a questão “por outro lado” por assim dizer, a proposta pode fazer mais sentido. Mais do que comprometer qualquer celebração atual do usus antiquior em toda a sua pureza em latim – e sem de forma alguma desencorajar os sacerdotes a aprender latim de maneira a celebrar o usus antiquior –, é provável que, pelo menos para o momento, há muitos sacerdotes que não conseguem celebrar o usus antiquior porque não têm conhecimento de latim. O valor da forma antiga da Missa não reside apenas no uso do latim. O ritual, as orações silenciosas do sacerdote, o ciclo de leituras, o calendário dos tempos e muitos outros elementos oferecem um caminho em direção à ars celebrandi que o Papa Bento XVI procura recuperar na celebração ordinária, do dia-a-dia, da Missa. Se fosse dada aos sacerdotes, que apenas celebram Missas em inglês na forma nova, a opção de celebrar em inglês na forma antiga, muitos dos que estão preocupados com a reverência e o sentido do sagrado na Liturgia seriam desafiados pela possibilidade de considerar o que foi perdido, e encorajados a melhorar sua celebração da forma nova pela familiaridade com a forma antiga.



Sobre o autor

Pe. Timothy Finigan obteve graduação de primeira classe em filosofia e psicologia em Oxford e depois estudou teologia em Roma, onde se especializou em patrística e história da teologia, obtendo também um diploma summa cum laude em Letras Latinas sob Pe. Reginald Foster. Ordenado em 1984, tem exercido seu ministério sacerdotal trabalhando em paróquias na Arquidiocese de Southwark. Juntamente com isso, ministra aulas e é escritor. Atualmente ensina teologia sacramental no Seminário St. John, Wonersh, e teologia dogmática em St. Hugh’s Charterhouse, Parkminster. Foi editor da revista Faith Magazine por oito anos e continua a contribuir com a publicação. Suas publicações recentes incluem artigos sobre a Imaculada Conceição para os Franciscanos da Imaculada, e artigos para a Humanae Vitae e o Gospel of Life. Escreve regularmente uma coluna para o Catholic Herald e o blog “The Hermeneutic of Continuity”. Tem escrito e dado aulas sobre a Liturgia Romana tradicional. Após o Summorum Pontificum, sua paróquia foi uma das primeiras a ter o usus antiquior celebrado todos os domingos como parte da agenda paroquial.

Contato: blackfencatholic@gmail.com Este endereço de e-mail está protegido contra spambots. Você deve habilitar o JavaScript para visualizá-lo.


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[i] Ver: [acessado em 14 de Fevereiro de 2011].

[ii] Sagrada Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos, Institutio Generalis Missalis Romani (d’ora em diante: IGMR), (Cidade do Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2002 (2000)), §274. ‘Post ostensionem hostiae, post ostensionem calicis et ante Communionem’.

[iii] Cf. Sagrada Congregação para os Ritos, ‘Segunda Instrução sobre a aplicação organizada da Constituição sobre a Liturgia’, res Abhinc Annos de 4 de Maio de 1967, III, 7. Ver Acta Apostolicae Sedis, (Cidade do Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 1967), 59, pp. 442–448. ‘Post elevationem hostiae et post elevationem calicis’ (p. 444).

[iv] Notitiae (Cidade do Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 1978), 14: 2, pp. 301–302. ‘Ubi rubricae Missalis Pauli VI nihil dicunt aut parum dicunt singillatim in nonnullis locis, non ideo inferendum est quod oporteat servare ritum antiquum. Proinde, non sunt iterandi gestus multiplices atque implexi turificationis iuxta praescripta Missalis prioris’.

[v] Ritus Servandus in Celebratione Missae, I, 3. (Cidade do Vaticano: Libreria Editrice Vaticana) ’Tum Alba induitur, caput submittens, deinde manicam dexteram brachio dextero, et sinistram sinistro imponens’.

[vi] IGMR, §119. ‘Nisi ob ipsius albae formam non exigantur’.

[vii] Papa Bento XVI, Carta aos Bispos de 7 de Julho de 2007, por ocasião da publicação da Carta Apostólica sob a forma de Motu Proprio Summorum Pontificum sobre o uso da Liturgia Romana anterior à reforma de 1970.

[viii] Bento XVI, motu proprio de 7 de Julho de 2007, Summorum Pontificum, em Acta Apostolicae Sedis, 99, §1. ‘Hae duae expressiones “legis orandi” Ecclesiae, minime vero inducent in divisionem “legis credendi” Ecclesiae; sunt enim duo usus unici ritus romani’.

[ix] Cf. por exemplo, Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, Instructio de quibusdam normis circa cultum mysterii eucharistici (Instrução “A respeito do culto do mistério Eucarístico”) Inaestimabile Donum, de 3 de Abril de 1980, em Acta Apostolicae Sedis, 72, pp. 331–343; Instructio: de quibusdam observandis et vitandis circa sanctissimam Eucharistiam (Instrução “Sobre certas questões a serem observadas ou evitadas em relação à Santíssima Eucaristia”) Redemptionis Sacramentum, de 25 de Março de 2004, em Acta Apostolicae Sedis, 96, pp. 549–601.

[x] Papa João Paulo II, Carta Apostólica de SS. Eucharistiae Mysterio et Cultu (sobre o mistério e o culto da Eucaristia) Dominicae Cenae, de 24 de Fevereiro de 1980, em Acta Apostloicae Sedis, 72, pp. 113–148. ‘Extremam vero iam manum imposituri hisce considerationibus Nostris, velimus veniam petere — nomine quidem Nostro omniumque vestrum, Venerabiles ac Dilecti in episcopate Fratres, — universarum illarum rerum quae, ob quasvis causas quamlibetque ob humanam debilitatem, impatientiam, neglegentiam vel etiam propter exsecutionem interdum imperfectam, singularem, falsam praescriptorum Concilii Vaticani II, ingerere potuerunt scandalum vel difficultatem circa doctrinae interpretationem et venerationem huic excelso Sacramento debitam’ (p. 145).

[xi] Cf. Papa João Paulo II, Dominicae Cenae (1980), §12, p. 144. ‘Non licet velut “possessorum” qui libere decernat de liturgico textu et ritu sacro quasi de suo peculiari bono’.

[xii] Há uma escola no estudo moderno da Liturgia que nega a existência de um “Ofertório” na forma nova da Missa. Tomarei a visão oposta e presumirei que se há um canto no Gradual moderno chamado Offertorium e uma oração chamada Super Oblata no fim, então podemos presumir que alguma coisa foi oferecida.

[xiii] IGMR, §275a. “Inclinatio capitis fit cum tres Divinae Personae simul nominantur, et ad nomen Iesu, beatae Mariae Virginis et Sancti in cuius honorem celebrator Missa”.

[xiv] Texto original do Missale Romanum Editio Typica Tertia (Cidade do Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2002), p. 514, n. 23. “Sacerdos, stans ad altare, accipit patenam cum pane, eamque ambabus manibus aliquantulum elevatam super altare tenet, submissa voce dicens: [...] Si vero cantus ad offertorium non peragitur, sacerdoti licet haec verba elata voce proferre; in fine populus acclamare potest: Benedíctus Deus in saecula”.

[xv] Joseph Cardinal Ratzinger, The Spirit of the Liturgy, trad. de Jana Almeida Olsansky (Prior Velho: Paulinas, 2006 (2001)), pp. 158–159.



Fonte: Presbitéros

De quem é a culpa?

“Caríssimos irmãos e irmãs, em Cristo. Hoje trazemos um belíssimo artigo de nosso novo membro de Apostolado: Douglas. No artigo ele trata de questões bastante atuais da Liturgia, como, por exemplo, a não aceitação da Missa na Forma Ordinária pelos ditos ‘tradicionalistas’ (ML)”



Olhando para o mundo de hoje, qualquer ser humano de correta visão pode ver que estamos passando por uma crise na Igreja, afirmada - aliás - por diversos Papas.

Os ditos "tradicionalistas" se enganam e mostram uma falta de raciocínio e/ou conhecimento a respeito do Rito Romano e entram no absurdo equívoco de se revoltarem contra o Romano Pontífice dizendo que o Papa errou. Oras... o Papa é infalível, assim como o Magistério da Igreja.

Não faz sentido culpar o Rito do Santo Padre, o Papa Paulo VI, atual rito ordinário da Missa, pela bagunça feita por aqueles que deviam cumprí-lo, amá-lo e defendê-lo na alegria e na tristeza. Sinto informar, mas um padre que não cumpre a forma de Paulo VI e faz ali bagunça, também cometerá os mesmos erros se usar a forma de Pio V.

Então quem segue essa teoria absurda comete o mesmo erro, em substância, que aqueles a quem ele critica: o erro da desobediência. De não comungarem com o Romano Pontífice.

Estaria, por acaso, a Igreja dando de alimento a seus filhos um veneno como se fosse alimento? Obviamente que não. Simplesmente absurda esta idéia. Não existe Rito Mau aprovado pela Igreja, o que existem são homens pervertidos que pervertem a sacralidade da Liturgia para sua própria vontade.

A culpa em momento nenhum é do Concílio, estivesse quem estiver lá dentro, afinal é um Concílio aprovado pelo Papa, e Urbi Petrus, ibi Ecclesiae. Negar o Vaticano II é negar a infalibilidade papal, é negar portanto a assistência do Espírito Santo à Santa Igreja, é negar as palavras do próprio criador ao dizer: "Estarei convosco até o fim dos tempos"(1).

E essas palavras de nosso Redentor me confortam e por isso rogo a Deus que, por sua graça, eu morra católico.

Mas o que está acontecendo, afinal? Se a culpa não é do Concílio, a culpa é de quem?



O então Cardeal Ratzinger afirmara: "Estou convencido de que a crise da Igreja na qual hoje nos encontramos depende em grade parte do desmoronamento da liturgia"(2).

Ainda quando Cardeal, o nosso atual Papa comentava:"Depois do Concílio, muitos padres deliberadamente erigiram a dessacralização como um programa de ação, argumentado que o novo testamento aboliu o culto do templo; o véu do templo, que se rasgou de alto a baixo no momento da morte de Cristo sobra a cruz, seria, para alguns, o sinal do fim do sagrado. A morte de Jesus, fora dos muros da cidade, o que significa, no mudo profano, é hoje a verdadeira religião. A religião, se ela algum dia teve existência, deve encontrá-la no caráter não sagrado da vida cotidiana, no amor que se vive. Animados por tais idéias, eles rejeitaram as vestes sagradas; tanto quanto puderam, eles despojaram as igrejas dos seus resplendores que lembram o sagrado; e eles reduziram a liturgia à linguagem e aos gestos da vida de todos os dias, por meio de saudações, de sinais de amizade e outros elementos."(3)

O Papa Paulo VI, que viveu o turbilhão da crise, intitulava-a como sendo "a fumaça de Satanás no Templo de Deus".(4)

Em recente entrevista, o Cardeal Virgílio Noé, cerimoniário da Santa Sé, explicou que, com a expressão "fumaça de Satanás no templo de Deus", Paulo VI se referia aos abusos litúrgicos pós-conciliares(5): "Aqui, o Papa Montini por 'Satanás' queria classificar todos aqueles sacerdotes, bispos e cardeais que não redem culto ao Senhor ao celebrar mal a Santa Missa, devido uma errada interpretação e aplicação do Concílio Vaticano II. Falou de fumaça de Satanás, porque sustentava que aqueles sacerdotes que manipulavam a Santa Missa em nome da criatividade, em realidade estavam possuídos da vanglória e da sabedoria do Maligno. Portanto, a fumaça de Satanás não era outra coisa que a mentalidade queria distorcer as regras tradicionais e litúrgicas da cerimônia Eucarística.... Ele condenava o espírito de protagonismo e delírio de onipotência que se seguiram à liturgia do Concílio. A Missa é uma cerimônia sagrada, repetia frequentemente, tudo deve estar preparado e estudado adequadamente respeitando os cânones, ninguém é 'dominus' (Senhor) da Missa. Infelizmente, muitos depois do Vaticano II não o entenderam e Paulo VI considerava o fenômeno um ataque do demônio."(6)



Muitas vezes devido a tantos abusos, muitos se afastam - clérigos e leigos - da Verdade. Revoltados, pois, com os abusos cometidos, muitos colocam a culpa de tudo no Concílio. O Vaticano II não foi nenhuma "reunião inválida de homens velhos" nem tampouco "o Concílio mais importante, mais surpreendente", mas sim o vigésimo primeiro Concílio da Igreja. Antes dele tiveram 20 Concílios igualmente importantes e válidos. Não se pode olhar, portanto, para o Concílio com outra interpretação senão a hermenêutica da continuidade, ou seja, ele não veio rompendo com o passado glorioso e santificador da Igreja, gerador de tantos santos e santas que hoje veneramos, mas sim como uma evolução.

De fato, um leigo que não esteja acostumado, ao ver uma Missa celebrada corretamente em latim e ad orientem segundo o Rito Romano na forma de Paulo VI e na forma de Pio V (Missa Tridentina) dificilmente diferenciará uma forma de outra do rito. Não raramente ouvimos pessoas sem esclarecimento dizendo, referindo-se à forma de Pio V (extraordinária no Brasil, com excessão de Campos-RJ) como "Missa em Latim", como se o Novo Ordo não fosse em Latim.

O erro, portanto, está em não cumprir as normas estabelecidas pela Santa Sé, sobre o poder do próprio Cristo, Verdade e Vida e julgar-se dono da Liturgia por qualquer motivo que seja.



O Papa Pio XII nos adverte: "Erro perigosos estão, pois, aqueles que julgam poder unir-se a Cristo, cabeça da Igreja, sem aderirem fielmente ao seu Vigário na terra. Suprimida a cabeça visível e rompidos os vínculos visíveis da unidade, obscurecem e deformam de tal maneira o corpo místico do Redentor, que não pode ser visto nem encontrado por quem procura o porto da eterna salvação."(7)








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NOTAS:

(1) Mt(28,20).

(2) Joseph Ratzinger, La mia vita, San Paolo, pág. 112 e 113.

(3) Conferência aos Bispos chilenos, Santiago, 13 de julho de 1988.

(4) Paulo VI, alocução de 29 de junho de 1972.

(5) Que em nada tiveram sua culpa no próprio Concílio, mas na arrogância opulenta de vários sacerdotes que em nada entenderam o espírito do Concílio, mas antes tiveram dele uma hermenêutica de ruptura e não de continuidade. Descartaram a ação de Cristo na Igreja por mais de 400 anos (da forma antiga do rito) e durante 1970 anos de Igreja para seguir suas próprias cabeças passando a não ser os padres que deveriam ser. Outros tão errados quanto, acham que após o Vaticano II, Cristo passou a ser mentiroso e deixar de cumprir o que prometera e exponho na nota (1).

(6) Cardeal Virgílio Noé, mestre das celebrações litúrgicas de Paulo VI, João Paulo I e João Paulo II - Entrevista a "Petrus", quotidiano on-line sobre Pontificado de Bento XVI, em 14 de maio de 2008

(7) Encíclica Mystici Corporis, n.40.

Mensagem do Papa para a Quaresma de 2011

«Sepultados com Ele no batismo, foi também com Ele que ressuscitastes» (cf. Cl 2, 12)
Amados irmãos e irmãs!
A Quaresma, que nos conduz à celebração da Santa Páscoa, é para a Igreja um tempo litúrgico muito precioso e importante, em vista do qual me sinto feliz por dirigir uma palavra específica para que seja vivido com o devido empenho. Enquanto olha para o encontro definitivo com o seu Esposo na Páscoa eterna, a Comunidade eclesial, assídua na oração e na caridade laboriosa, intensifica o seu caminho de purificação no espírito, para haurir com mais abundância do Mistério da redenção a vida nova em Cristo Senhor (cf. Prefácio I de Quaresma).
1. Esta mesma vida já nos foi transmitida no dia do nosso Batismo, quando, «tendo-nos tornado partícipes da morte e ressurreição de Cristo» iniciou para nós «a aventura jubilosa e exaltante do discípulo» (Homilia na Festa do Batismo do Senhor, 10 de Janeiro de 2010). São Paulo, nas suas Cartas, insiste repetidas vezes sobre a singular comunhão com o Filho de Deus realizada neste lavacro. O fato que na maioria dos casos o Batismo se recebe quando somos crianças põe em evidência que se trata de um dom de Deus: ninguém merece a vida eterna com as próprias forças. A misericórdia de Deus, que lava do pecado e permite viver na própria existência «os mesmos sentimentos de Jesus Cristo» (Fl 2, 5), é comunicada gratuitamente ao homem.
O Apóstolo dos gentios, na Carta aos Filipenses, expressa o sentido da transformação que se realiza com a participação na morte e ressurreição de Cristo, indicando a meta: que assim eu possa «conhecê-Lo, a Ele, à força da sua Ressurreição e à comunhão nos Seus sofrimentos, configurando-me à Sua morte, para ver se posso chegar à ressurreição dos mortos» (Fl 3, 10-11). O Batismo, portanto, não é um rito do passado, mas o encontro com Cristo que informa toda a existência do batizado, doa-lhe a vida divina e chama-o a uma conversão sincera, iniciada e apoiada pela Graça, que o leve a alcançar a estatura adulta de Cristo.
Um vínculo particular liga o Batismo com a Quaresma como momento favorável para experimentar a Graça que salva. Os Padres do Concílio Vaticano II convidaram todos os Pastores da Igreja a utilizar «mais abundantemente os elementos batismais próprios da liturgia quaresmal» (Const. Sacrosanctum Concilium, 109). De fato, desde sempre a Igreja associa a Vigília Pascal à celebração do Batismo: neste Sacramento realiza-se aquele grande mistério pelo qual o homem morre para o pecado, é tornado partícipe da vida nova em Cristo Ressuscitado e recebe o mesmo Espírito de Deus que ressuscitou Jesus dos mortos (cf. Rm 8, 11). Este dom gratuito deve ser reavivado sempre em cada um de nós e a Quaresma oferece-nos um percurso análogo ao catecumenato, que para os cristãos da Igreja antiga, assim como também para os catecúmenos de hoje, é uma escola insubstituível de fé e de vida cristã: realmente eles vivem o Batismo como um ato decisivo para toda a sua existência.
2. Para empreender seriamente o caminho rumo à Páscoa e nos prepararmos para celebrar a Ressurreição do Senhor – a festa mais jubilosa e solene de todo o Ano litúrgico – o que pode haver de mais adequado do que deixar-nos conduzir pela Palavra de Deus? Por isso a Igreja, nos textos evangélicos dos domingos de Quaresma, guia-nos para um encontro particularmente intenso com o Senhor, fazendo-nos repercorrer as etapas do caminho da iniciação cristã: para os catecúmenos, na perspectiva de receber o Sacramento do renascimento, para quem é batizado, em vista de novos e decisivos passos no seguimento de Cristo e na doação total a Ele.
O primeiro domingo do itinerário quaresmal evidencia a nossa condição de homens nesta terra. O combate vitorioso contra as tentações, que dá início à missão de Jesus, é um convite a tomar consciência da própria fragilidade para acolher a Graça que liberta do pecado e infunde nova força em Cristo, caminho, verdade e vida (cf. Ordo Initiationis Christianae Adultorum, n. 25). É um claro chamado a recordar como a fé cristã implica a exemplo de Jesus e em união com Ele, uma luta «contra os dominadores deste mundo tenebroso» (Hb 6, 12), no qual o diabo é ativo e não se cansa, nem sequer hoje, de tentar o homem que deseja aproximar-se do Senhor: Cristo disso sai vitorioso, para abrir também o nosso coração à esperança e guiar-nos na vitória às seduções do mal.
O Evangelho da Transfiguração do Senhor põe diante dos nossos olhos a glória de Cristo, que antecipa a ressurreição e que anuncia a divinização do homem. A comunidade cristã toma consciência de ser conduzida, como os apóstolos Pedro, Tiago e João, «em particular, a um alto monte» (Mt 17, 1), para acolher de novo em Cristo, como filhos no Filho, o dom da Graça de Deus: «Este é o Meu Filho muito amado: n’Ele pus todo o Meu enlevo. Escutai-O» (v. 5). É o convite a distanciar-se dos boatos da vida quotidiana para se imergir na presença de Deus: Ele quer transmitir-nos, todos os dias, uma Palavra que penetra nas profundezas do nosso espírito, onde discerne o bem e o mal (cf. Hb 4, 12) e reforça a vontade de seguir o Senhor.
O pedido de Jesus à Samaritana: «Dá-Me de beber» (Jo 4, 7), que é proposto na liturgia do terceiro domingo, exprime a paixão de Deus por todos os homens e quer suscitar no nosso coração o desejo do dom da «água a jorrar para a vida eterna» (v. 14): é o dom do Espírito Santo, que faz dos cristãos «verdadeiros adoradores» capazes de rezar ao Pai «em espírito e verdade» (v. 23). Só esta água pode extinguir a nossa sede do bem, da verdade e da beleza! Só esta água, que nos foi doada pelo Filho, irriga os desertos da alma inquieta e insatisfeita, «enquanto não repousar em Deus», segundo as célebres palavras de Santo Agostinho.
O domingo do cego de nascença apresenta Cristo como luz do mundo. O Evangelho interpela cada um de nós: «Tu crês no Filho do Homem?». «Creio, Senhor» (Jo 9, 35.38), afirma com alegria o cego de nascença, fazendo-se voz de todos os crentes. O milagre da cura é o sinal que Cristo, juntamente com a vista, quer abrir o nosso olhar interior, para que a nossa fé se torne cada vez mais profunda e possamos reconhecer n’Ele o nosso único Salvador. Ele ilumina todas as obscuridades da vida e leva o homem a viver como «filho da luz».
Quando, no quinto domingo, nos é proclamada a ressurreição de Lázaro, somos postos diante do último mistério da nossa existência: «Eu sou a ressurreição e a vida... Crês tu isto?» (Jo 11, 25-26). Para a comunidade cristã é o momento de depor com sinceridade, juntamente com Marta, toda a esperança em Jesus de Nazaré: «Sim, Senhor, creio que Tu és o Cristo, o Filho de Deus, que havia de vir ao mundo» (v. 27). A comunhão com Cristo nesta vida prepara-nos para superar o limite da morte, para viver sem fim n’Ele. A fé na ressurreição dos mortos e a esperança da vida eterna abrem o nosso olhar para o sentido derradeiro da nossa existência: Deus criou o homem para a ressurreição e para a vida, e esta verdade doa a dimensão autêntica e definitiva à história dos homens, à sua existência pessoal e ao seu viver social, à cultura, à política, à economia. Privado da luz da fé todo o universo acaba por se fechar num sepulcro sem futuro, sem esperança.
O percurso quaresmal encontra o seu cumprimento no Tríduo Pascal, particularmente na Grande Vigília na Noite Santa: renovando as promessas batismais, reafirmamos que Cristo é o Senhor da nossa vida, daquela vida que Deus nos comunicou quando renascemos «da água e do Espírito Santo», e reconfirmamos o nosso firme compromisso em corresponder à ação da Graça para sermos seus discípulos.
3. O nosso imergir-nos na morte e ressurreição de Cristo através do Sacramento do Batismo, estimula-nos todos os dias a libertar o nosso coração das coisas materiais, de um vínculo egoísta com a «terra», que nos empobrece e nos impede de estar disponíveis e abertos a Deus e ao próximo. Em Cristo, Deus revelou-se como Amor (cf 1 Jo 4, 7-10). A Cruz de Cristo, a «palavra da Cruz» manifesta o poder salvífico de Deus (cf. 1 Cor 1, 18), que se doa para elevar o homem e dar-lhe a salvação: amor na sua forma mais radical (cf. Enc. Deus caritas est, 12). Através das práticas tradicionais do jejum, da esmola e da oração, expressões do empenho de conversão, a Quaresma educa para viver de modo cada vez mais radical o amor de Cristo. O Jejum, que pode ter diversas motivações, adquire para o cristão um significado profundamente religioso: tornando mais pobre a nossa mesa aprendemos a superar o egoísmo para viver na lógica da doação e do amor; suportando as privações de algumas coisas – e não só do supérfluo – aprendemos a desviar o olhar do nosso «eu», para descobrir Alguém ao nosso lado e reconhecer Deus nos rostos de tantos irmãos nossos. Para o cristão o jejum nada tem de intimista, mas abre em maior medida para Deus e para as necessidades dos homens, e faz com que o amor a Deus seja também amor ao próximo (cf. Mc 12, 31).
No nosso caminho encontramo-nos perante a tentação do ter, da avidez do dinheiro, que insidia a primazia de Deus na nossa vida. A cupidez da posse provoca violência, prevaricação e morte: por isso a Igreja, especialmente no tempo quaresmal, convida à prática da esmola, ou seja, à capacidade de partilha. A idolatria dos bens, ao contrário, não só afasta do outro, mas despoja o homem, torna-o infeliz, engana-o, ilude-o sem realizar aquilo que promete, porque coloca as coisas materiais no lugar de Deus, única fonte da vida. Como compreender a bondade paterna de Deus se o coração está cheio de si e dos próprios projetos, com os quais nos iludimos de poder garantir o futuro? A tentação é a de pensar, como o rico da parábola: «Alma, tens muitos bens em depósito para muitos anos...». «Insensato! Nesta mesma noite, pedir-te-ão a tua alma...» (Lc 12, 19-20). A prática da esmola é uma chamada à primazia de Deus e à atenção para com o próximo, para redescobrir o nosso Pai bom e receber a sua misericórdia.
Em todo o período quaresmal, a Igreja oferece-nos com particular abundância a Palavra de Deus. Meditando-a e interiorizando-a para a viver quotidianamente, aprendemos uma forma preciosa e insubstituível de oração, porque a escuta atenta de Deus, que continua a falar ao nosso coração, alimenta o caminho de fé que iniciamos no dia do Batismo. A oração permite-nos também adquirir uma nova concepção do tempo: de fato, sem a perspectiva da eternidade e da transcendência ele cadencia simplesmente os nossos passos rumo a um horizonte que não tem futuro. Ao contrário, na oração encontramos tempo para Deus, para conhecer que «as suas palavras não passarão» (cf. Mc 13, 31), para entrar naquela comunhão íntima com Ele «que ninguém nos poderá tirar» (cf. Jo 16, 22) e que nos abre à esperança que não desilude, à vida eterna.
Em síntese, o itinerário quaresmal, no qual somos convidados a contemplar o Mistério da Cruz, é «fazer-se conformes com a morte de Cristo» (Fl 3, 10), para realizar uma conversão profunda da nossa vida: deixar-se transformar pela acção do Espírito Santo, como São Paulo no caminho de Damasco; orientar com decisão a nossa existência segundo a vontade de Deus; libertar-nos do nosso egoísmo, superando o instinto de domínio sobre os outros e abrindo-nos à caridade de Cristo. O período quaresmal é momento favorável para reconhecer a nossa debilidade, acolher, com uma sincera revisão de vida, a Graça renovadora do Sacramento da Penitência e caminhar com decisão para Cristo.
Queridos irmãos e irmãs, mediante o encontro pessoal com o nosso Redentor e através do jejum, da esmola e da oração, o caminho de conversão rumo à Páscoa leva-nos a redescobrir o nosso Batismo. Renovemos nesta Quaresma o acolhimento da Graça que Deus nos concedeu naquele momento, para que ilumine e guie todas as nossas ações. Tudo o que o Sacramento significa e realiza, somos chamados a vivê-lo todos os dias num seguimento de Cristo cada vez mais generoso e autêntico. Neste nosso itinerário, confiemo-nos à Virgem Maria, que gerou o Verbo de Deus na fé e na carne, para nos imergir como ela na morte e ressurreição do seu Filho Jesus e ter a vida eterna.
Vaticano, 4 de Novembro de 2010

Igreja celebra hoje Festa da Cátedra de São Pedro

A Liturgia latina celebra, neste dia 22 de fevereiro, a Festa da “Cátedra” de São Pedro. Trata-se de uma tradição muito antiga, testemunhada em Roma desde os finais do século IV, que dá graças a Deus pela missão confiada ao apóstolo Pedro e a seus sucessores. Na basílica de São Pedro, em Roma, encontra-se o monumento à “cátedra” do apóstolo, obra do escultor italiano Gian Lorenzo Bernini, executada em forma de grande trono de bronze, sustentada pelas estátuas de quatro doutores da Igreja, dois do Ocidente, Santo Agostinho e Santo Ambrósio, e dois do oriente, São João Crisóstomo e Santo Atanásio.


Mas por que é celebrada a “cátedra” de Pedro? A ela a tradição da Igreja atribui um forte significado espiritual e reconhece um sinal privilegiado do amor de Deus, Pastor bom e eterno, que quer reunir toda sua Igreja e guiá-la pelo caminho da salvação.



A “cátedra” literalmente quer dizer a sede fixa do bispo, localizada na Igreja mãe de uma diocese que, por este motivo, é chamada “catedral”. Ela simboliza a autoridade do bispo e, em particular, de seu “magistério”, ou seja, do ensinamento evangélico que ele, enquanto sucessor dos apóstolos, está chamado a transmitir à comunidade cristã.



Qual foi, então, a “cátedra” de São Pedro? Ele, escolhido por Cristo como “rocha” sobre a qual a Igreja seria edificada (cf. Mateus 6, 18), começou seu ministério em Jerusalém, depois da ascensão do Senhor e de Pentecostes. A primeira “sede” da Igreja foi o Cenáculo, em Jerusalém. É provável que naquela sala, onde também Maria, a Mãe de Jesus, rezou junto aos discípulos, se reservasse um posto especial a Simão Pedro.



Em seguida, a sede de Pedro foi Antioquia, cidade situada no rio Oronte, na Síria, hoje Turquia. Naqueles tempos era a terceira cidade do Império Romano depois de Roma e de Alexandria do Egito. Daquela cidade, evangelizada por Barnabé e Paulo, onde “pela primeira vez os discípulos receberam o nome de “cristãos” (Atos 11, 26), Pedro foi o primeiro bispo da Igreja.



Depois, a Providência levou Pedro a Roma. Portanto, encontramo-nos com o caminho que vai de Jerusalém (Igreja nascente) a Antioquia (primeiro centro da Igreja, que agrupava pagãos) e também unida à Igreja proveniente dos judeus. Depois, Pedro dirigiu-se a Roma, centro do Império, onde concluiu com o martírio sua carreira ao serviço do Evangelho.



Por esse motivo, a sede de Roma, que havia recebido a maior honra, recebeu também a tarefa confiada por Cristo a Pedro: estar a serviço de todas as Igrejas particulares para a edificação e a unidade de todo o Povo de Deus. A sede de Roma, depois dessas migrações de São Pedro, foi reconhecida como a do sucessor de Pedro, e a “cátedra” de seu bispo representou a do apóstolo encarregado por Cristo de apascentar todo seu rebanho. A cátedra do bispo de Roma representa, portanto, não só seu serviço à comunidade romana, mas também sua missão de guia de todo o Povo de Deus.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Prefácio de Bento XVI ao catecismo para jovens Youcat

SUBSÍDIO
AO CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA
DESTINADO AOS JOVENS NA PERSPECTIVA
DA JMJ 2011 EM MADRID
[16-21 DE AGOSTO]


Queridos jovens amigos!

Hoje aconselho-vos a leitura de um livro extraordinário.

É extraordinário pelo seu conteúdo mas também pelo modo em que se formou, que desejo explicar-vos brevemente, para que se possa compreender a sua particularidade. Youcat teve origem, por assim dizer, de outra obra que remonta aos anos 80. Era um período difícil para a Igreja e para a sociedade mundial, durante o qual surgiu a necessidade de novas orientações para encontrar o caminho rumo ao futuro. Após o Concílio Vaticano II (1962-1965) e no mudado clima cultural, muitas pessoas já não sabiam correctamente no que os cristãos deveriam acreditar exactamente, o que a Igreja ensinava, se ela podia ensinar algo tout court e como tudo isto podia adaptar-se ao novo clima cultural.

O Cristianismo como tal não está superado? Pode-se ainda hoje racionalmente ser crente? Estas são as questões que muitos cristãos se formulam até nos nossos dias. O Papa João Paulo II optou então por uma decisão audaz: deliberou que os bispos do mundo inteiro escrevessem um livro com o qual responder a estas perguntas.

Ele confiou-me a tarefa de coordenar o trabalho dos bispos e de vigiar a fim de que das suas contribuições nascesse um livro — quero dizer, um livro verdadeiro e não uma simples justaposição de uma multiplicidade de textos. Este livro devia ter o título tradicional de Catecismo da Igreja Católica e todavia ser algo absolutamente estimulante e novo; devia mostrar no que a Igreja Católica crê hoje e de que maneira se pode acreditar de modo racional. Assustei-me com esta tarefa e devo confessar que duvidei que algo semelhante pudesse ter bom êxito. Como podia acontecer que autores espalhados pelo mundo pudessem produzir um livro legível?

Como podiam homens que vivem em continentes diversos, e não só sob o ponto de vista geográfico, mas inclusive intelectual e cultural, produzir um texto dotado de uma unidade interna e compreensível em todos os continentes?

A isto acrescentava-se o facto de que os bispos deviam escrever não simplesmente como autores individuais, mas em representação dos seus irmãos e das suas Igrejas locais.

Devo confessar que até hoje me parece um milagre o facto de que este projecto no final se realizou.

Encontrámo-nos três ou quatro vezes por ano por uma semana e debatemos apaixonadamente sobre cada parte do texto, na medida em que se desenvolvia.

Como primeira atitude definimos a estrutura do livro: devia ser simples, para que cada grupo de autores pudesse receber uma tarefa clara e não forçar as suas afirmações num sistema complicado. É a mesma estrutura deste livro; ela é tirada simplesmente de uma experiência catequética de um século: o que cremos / de que modo celebramos os mistérios cristãos / de que maneira temos a vida em Cristo / de que forma devemos rezar. Não quero explicar aqui o modo como debatemos sobre a grande quantidade de questões, até chegar a compor um livro verdadeiro. Numa obra deste género são muitos os pontos discutíveis: tudo o que os homens fazem é insuficiente e pode ser melhorado, e não obstante, trata-se de um grande livro, um sinal de unidade na diversidade. A partir das muitas vozes pôde-se formar um coro porque tínhamos a comum partitura da fé, que a Igreja nos transmitiu desde os apostólos, através dos séculos até hoje.

Por que tudo isto?

Desde a redacção do CIC, tivemos que constatar que não só os continentes e as culturas das suas populações são diferentes, mas também no âmbito de cada sociedade existem diversos «continentes»: o trabalhador tem uma mentalidade diferente do camponês; um físico de um filólogo; um empresário de um jornalista, um jovem de um idoso. Por este motivo, na linguagem e no pensamento, tivemos que nos colocar acima de todas estas diferenças e, por assim dizer, buscar um espaço comum entre os diferentes universos mentais; com isto tornamo-nos cada vez mais conscientes do modo como o texto exigia algumas «traduções» nos diversos mundos, para poder alcançar as pessoas com as suas mentalidades diferentes e várias problemáticas. Desde então, nas Jornadas Mundiais da Juventude (Roma, Toronto, Colónia, Sydney) reuniram-se jovens de todo o mundo que querem acreditar, que estão em busca de Deus, que amam Cristo e desejam caminhos comuns. Neste contexto perguntámo-nos se não deveríamos traduzir o Catecismo da Igreja Católica na língua dos jovens e fazer penetrar as suas palavras no seu mundo. Naturalmente, também entre os jovens de hoje existem muitas diferenças; assim, sob a comprovada guia do arcebispo de Viena, Christoph Schönborn, formou-se um Youcat para os jovens. Espero que muitos se deixem cativar por este livro.

Algumas pessoas dizem-me que o catecismo não interessa à juventude moderna; mas não acredito nesta afirmação e estou certo de que tenho razão. A juventude não é tão superficial como é acusada de o ser; os jovens querem saber deveras no que consiste a vida. Um romance policial é empolgante porque nos envolve no destino de outras pessoas, mas que poderia ser também o nosso; este livro é cativante porque nos fala do nosso próprio destino e portanto refere-se de perto a cada um de nós.

Por isso, exorto-vos: estudai o catecismo! Estes são os meus votos de coração.

Este subsídio ao catecismo não vos adula; não oferece fáceis soluções; exige uma nova vida da vossa parte; apresenta-vos a mensagem do Evangelho como a «pérola de grande valor» (Mt 13, 45) pela qual é preciso dar tudo. Portanto, peço-vos: estudai o catecismo com paixão e perseverança! Sacrificai o vosso tempo por ele! Estudai-o no silêncio do vosso quarto, lede-o em dois, se sois amigos, formai grupos e redes de estudo, trocai ideias na internet. Permanecei de qualquer modo em diálogo sobre a vossa fé!

Deveis conhecer aquilo em que credes; deveis conhecer a vossa fé com a mesma exactidão com a qual um perito de informática conhece o sistema operativo de um computador; deveis conhecê-la como um músico conhece a sua peça; sim, deveis ser muito mais profundamente radicados na fé do que a geração dos vossos pais, para poder resistir com força e decisão aos desafios e às tentações deste tempo. Tendes necessidade da ajuda divina, se a vossa fé não quiser esgotar-se como uma gota de orvalho ao sol, se não quiserdes ceder às tentações do consumismo, se não quiserdes que o vosso amor afogue na pornografia, se não quiserdes trair os débeis e as vítimas de abusos e violência.

Se vos dedicardes com paixão ao estudo do catecismo, gostaria de vos dar ainda um último conselho: sabei todos de que modo a comunidade dos fiéis recentemente foi ferida por ataques do mal, pela penetração do pecado no seu interior, aliás, no coração da Igreja. Não tomeis isto como pretexto para fugir da presença de Deus; vós próprios sois o corpo de Cristo, a Igreja! Levai o fogo intacto do vosso amor a esta Igreja todas as vezes que os homens obscurecerem o seu rosto. «Sede diligentes, sem fraqueza, fervorosos de espírito, dedicados ao serviço do Senhor» (Rm 12, 11).

Quando Israel se encontrava no ponto mais obscuro da sua história, Deus chamou em seu socorro não os grandes e as pessoas estimadas, mas um jovem de nome Jeremias; ele sentiu-se chamado a uma missão demasiado grande: «Ah! Senhor Javé, não sou um orador, porque sou ainda muito novo!» (Jr 1, 6). Mas Deus replicou: «Não digas: sou ainda muito novo — porquanto irás aonde Eu te enviar, e dirás o que Eu te mandar» (Jr 1, 7).

Abençoo-vos e rezo cada dia por todos vós.


BENTO PP. XVI

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Descristianização e Revolução Anticristã

1. Introdução

O saudoso Papa João Paulo II, na sua fabulosa encíclica Veritatis Splendor, em 1993, denuncia que nossa sociedade vive hoje uma crise de fé e moral, que ele chama de “descristianização” – isto é, uma sociedade que era cristã e já não é mais. Ele afirma que "a descristianização que pesa sobre povos e comunidades inteiras, outrora ricas de fé e de vida cristã, comporta não só a perda da fé ou de qualquer modo a sua ineficácia na vida, mas também, e necessariamente, um declínio ou um obscurecimento do sentido moral: e isto, quer pela dissipação da consciência da originalidade da moral evangélica, quer pelo eclipse dos próprios princípios e valores éticos fundamentais." (Veritatis Splendor, 106) O termo "descristianização" também tem sido utilizado em várias ocasiões pelo Sumo Pontífice gloriosamente reinante, o Papa Bento XVI.

Um rápido olhar histórico nos dá, em relação a esta crise, constatar que vivemos uma verdadeira revolução anticristã, que vem destruindo a ordem cristã anteriormente estabelecida. Com efeito, desde a conversão do Império Romano à fé católica no século IV, e graças a colaboração entre a Santa Igreja e o Estado que se estabeleceu à partir de então, o ocidente foi evangelizado e a Santa Igreja Católica Apostólica Romana gerou uma cultura cristã na sociedade ocidental, que vigorou fortemente durante toda a Idade Média. Graças a isto, as Américas posteriormente receberam o anúncio do Santo Evangelho.

Foi em relação à Idade Média que o Papa Leão XIII escreveu, em 1885: "Tempo houve em que a filosofia do Evangelho governava os Estados. Nessa época, a influência da sabedoria cristã e a sua virtude divina penetravam as leis, as instituições, os costumes dos povos, todas as categorias e todas as relações da sociedade civil. Então a religião instituída por Jesus Cristo, solidamente estabelecida no grau de dignidade que lhe é devido, em toda parte era florescente, graças ao favor dos príncipes e à proteção legítima dos magistrados. Então o sacerdócio e o império estavam ligados em si por uma feliz concórdia e pela permuta amistosa de bons ofícios. Organizada assim, a sociedade civil deu frutos superiores a toda expectativa, frutos cuja memória subsiste e subsistirá, consignada como está em inúmeros documentos que artifício algum dos adversários poderá corromper ou obscurecer." (Immortale Dei, 28)

Esta mencionada revolução anticristã, em seu processo de descristianização, pode ser claramente identificada em suas três primeiras fases: a revolução protestante, a revolução francesa e a revolução socialista. Antes, porém, de explicitarmos tais etapas, importa conhecer o mecanismo de tal revolução.



2. Mecanismo da revolução

A revolução anticristã tem origem em duas perigosas tendências da natureza humana decaída pelo pecado original: o ORGULHO e a SENSUALIDADE. Estes dois vícios, aliás, aparecem no pecado original (Gn 3): foi por orgulho que Satanás tentou o homem a ser igual a Deus (“No dia em que comerdes o fruto, sereis como deuses, conhecedores do bem e do mal!”) e foi por sensualidade que ele optou em experimentar do prazer que o fruto proibido proporcionaria (“A mulher, vendo que o fruto da árvore era de bom sabor e de muito agradável aspecto...”).

Tais tendências se fazem presentes na revolução anticristã atual. O orgulho gera o ódio a toda superioridade, autoridade, hierarquia e diferença. A sensualidade gera o apetite desordenado ao prazer sensível na terra. Tais tendências desordenadas se manifestam através das idéias LIBERAIS e IGUALITÁRIAS da revolução anticristã, isto é, de um liberalismo moral contrário à lei natural e um ódio a toda e qualquer desigualdade, mesmo às desigualdades justas.

Em relação ao liberalismo moral da revolução, o Sagrado Magistério da Igreja, infalível em matéria de fé e moral, é claro em ensinar que existe uma lei moral natural, que é objetiva (Catecismo da Igreja Católica, 2035; 1954-1960). Embora a adesão a ela exija muitas vezes um combate interior, seu cumprimento é condição para que o ser humano viva em comunhão com Deus e haja ordem social - ordem esta que haveria se todos os homens adorassem a Deus, se houvesse amor e respeito nas famílias, perdão entre os homens e entre os povos, e não houvessem homicídios voluntários, adultérios, roubos, assaltos, invasões de terra, mentiras, nacionalismos desordenados, governos totalitários, e assim por diante.

Em relação ao igualitarismo da revolução, importa esclarecer aqui a diferença das desigualdades justas e injustas; as injustas são aquelas que atentam contra a ordem natural das coisas e a dignidade do ser humano - por exemplo, é vítima de uma desigualdade injusta o ser humano que não possui alimento, moradia ou outras condições dignas de vida. As desigualdades justas são aquelas que estão de acordo com a ordem natural das coisas. Podemos citar aqui, por exemplo,

•a hierarquia celeste: nos ensina a teologia católica que Deus, em sua infinita dignidade, está acima de toda a criatura; a Santíssima Virgem, acima dos santos anjos, que estão acima dos santos, e mesmo entre eles há graus de glória diversos (se eu alcançar menos méritos do que Santa Terezinha alcançou na terra, eu não terei no céu o mesmo grau de glória que ela);
•as desigualdades que decorrem da hierarquia da Santa Igreja instituída por Nosso Senhor Jesus Cristo - e nela o Santo Padre está acima dos demais Bispos, que estão acima dos demais sacerdotes, que estão acima dos diáconos, que estão acima dos leigos (Catecismo da Igreja Católica, 874-896);
•as desigualdades terrenas que decorrem das diferenças acidentais entre os seres humanos - por exemplo, se uma pessoa X trabalha e a Y não quer trabalhar, é natural que a pessoa X enriqueça mais que a pessoa Y, e isto é justo! Mais ainda, é natural que os filhos da pessoa X tenham uma herança maior que os filhos da pessoa Y, e isto também é justo (Catecismo da Igreja Católica, 1934-1938); negar isso seria atentar contra o direito natural à propriedade privada (Catecismo da Igreja Católica, 2401).
Poderíamos chamar as idéias liberais e igualitárias, que a revolução anticristã traz, de um grande mecanismo coletivo de negação da verdade objetiva. Pe. Raniero Cantalamessa, pregador do Casa Pontifícia, escreveu: "Em vez de libertar-se do pecado, hoje todo empenho concentra-se em libertar-se do remorso do pecado; em vez de lutar contra o pecado, luta-se contra a idéia de pecado. Faz-se o que, em todas as demais áreas, é tido como a pior coisa possível, isto é, negar o problema, em vez de resolvê-lo; rechaçar e sepultar o mal no inconsciente, em vez de removê-lo, como quem imaginasse eliminar a morte, eliminando a idéia da morte ou como quem se preocupasse com eliminar a febre sem preocupar-se com a doença, cujo providencial sintoma revelador é a febre." ("A vida sob o Senhorio de Cristo", cap.7, 1996)



3. Primeiras etapas da revolução

Como falamos acima, a primeira etapa da revolução anticristã se deu com a REVOLUÇÃO PROTESTANTE, iniciada no século XV por Martinho Lutero e Calvino, rompendo com o Sagrado Magistério da Igreja e propondo a livre interpretação da Sagrada Escritura (o que carece totalmente de coerência, tendo em vista que foi o próprio Sagrado Magistério da Igreja quem compilou a Sagrada Escritura no pontificado de S. Dâmaso, no séc. IV!). Nesta etapa:

•O igualitarismo se manifesta através da negação protestante da autoridade do Santo Padre e da negação da diferença essencial e mística entre ministros ordenados e leigos.
•O liberalismo moral se manifesta através do princípio protestante da livre interpretação da Sagrada Escritura, o que propiciou já de início a supressão do celibato e aceitação do divórcio.
Sendo a Santa Igreja grande promotora da ordem social, o golpe que ela sofre na revolução protestante tem efeito na sociedade. Ocorre a partir de então o surgimento e disseminação das falsas doutrinas do racionalismo (que vê a razão humana como único caminho para conhecer a realidade, descartando a possibilidade da Revelação Divina) e do iluminismo, que em uma nítida conspiração contra a Santa Igreja e à cultura gerada por ela, propaga a idéia de que a Idade Média foi a “idade das trevas” - idéia esta que infelizmente ainda hoje se faz presente.

A propagação de tais doutrinas, por sua vez, geram, no século XVIII, a segunda grande etapa da revolução anticristã: a REVOLUÇÃO FRANCESA, liderada pelos intelectuais racionalistas e iluministas. Nesta etapa:

•O igualitarismo se manifesta através do ódio à nobreza em parte do povo: é importante esclarecer aqui que o abuso não tolhe o uso; mesmo que haja abusos da nobreza, abolir as classes sociais é atentar contra a ordem natural das coisas, como já foi demonstrado acima - o poder absolutista dos reis, aliás, que foi um dos fatores que provocou a Revolução Francesa (e é um abuso evidente!), inexistia na Idade Média, onde havia o sistema feudal (essencialmente descentralizador).
•O liberalismo moral se manifesta na recusa da sujeição a Deus, através da vitória do ateísmo e do agnosticismo que se dá com a separação radical entre a Santa Igreja e o Estado - o que atenta contra a doutrina social católica, como ensinaram explicitamente os Papas Gregório XVI, Beato Pio IX e São Pio X (nos documentos Mirari Vos, 16; Quanta Cura, 3; Syllabus, preposição 55; Vehementer Nos).
A Revolução Francesa significou o holocausto de inúmeros sacerdotes, religiosos e leigos católicos que se opuseram a ela.

A terceira grande etapa da revolução anticristã se dá já no século XX, com a REVOLUÇÃO SOCIALISTA, que significa a aplicação do igualitarismo revolucionário no campo econômico, atentando contra as justas desigualdades que decorrem do direito natural à propriedade privada e do direito natural à livre iniciativa.

Na Rússia, nesta etapa:

•O igualitarismo se manifesta também nesta etapa através da negação explícita da existência de Deus na doutrina comunista de Marx.
•O liberalismo moral através de uma “onipotência do Estado” - o Estado não tem, evidentemente, o direito de atentar contra a lei natural, como o faz quando nega os direitos à propriedade privada e à livre iniciativa (Catecismo da Igreja Católica, 2425).
Tal revolução significou o martírio de muitos cristãos ortodoxos na Ex-União Soviética.

Como uma falsa reação ao marxismo, surge posteriomente na Alemanha o socialismo nacionalista liderado por Hitler: o nazimo. Seu partido era chamado "Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães", sendo portanto também um filho da revolução. Ao contrário do que se diz em alguns meios, a Santa Igreja se opôs frontalmente ao nazismo, que foi condenado pelo Papa Pio XI, na encíclica "Mit Brennener Sorge" (em português, "Com crescente apreensão"). O nazismo colaborou na catástrofe da segunda grande guerra mundial, cumprindo-se o que a Santíssima Virgem havia predito em Fátima, em 1917: "Se atenderem aos meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz. Se não, ela vai espalhar seus erros pelo mundo gerando guerras. (...) Esta guerra vai terminar, mas se o mundo não parar de ofender a Deus, no reinado de Pio XI começará outra pior."



4. Revolução na atualidade

Nas últimas décadas, parece estar avançando uma quarta etapa da revolução anticristã, identificada por pensadores católicos como um TRIBALISMO, isto é, uma dissolução geral dos traços da civilização que a fé católica gerou e o retorno a um estado de vida pagão e anterior à civilização cristã.

O liberalismo moral se manifesta atualmente sobretudo no liberalismo sexual a partir da década de 1960, bem como nos atentados contra a vida humana através da tentativa de justificação do aborto, da eutanásia e das experiências com células-tronco embrionárias. O apetite desordenado ao prazer sensível na terra e o ódio desordenado ao sofrimento manifesta-se ainda, nas correntes mais avançadas da revolução anticristã, em um pacifismo, que rejeita todo e qualquer uso da violência - mesmo se for usado nas situações lícitas e por causa nobres, como a legítima defesa e a guerra justa na defesa de uma nação (Catecismo da Igreja Católica, 2270-2279; 2263-2267; 2307-2314).

O igualitarismo, nesta etapa, embora se manifeste nos fatos através de um avanço de várias leis civis socialistas no ocidente, manifesta-se também nas correntes mais avançadas da revolução:

•Na atual utopia da abolição total do estado, que se tornaria, segundo tais revolucionários, “desnecessário pela evolução da consciência humana” - o que também é manifestação do liberalismo moral, pelo sonho em viver sem estar submisso a nenhuma autoridade e nenhuma lei, o que contraria a doutrina social católica (Catecismo da Igreja Católica, 1897-1904).
•Com a doutrina panteísta da New Age, no campo religioso, onde tudo e todos são considerados divindade e não há distinção entre Criador e criatura.
•Em um ecologismo desordenado que nega a dignidade do ser humano e o iguala a qualquer outro ser - por isso há mais interesse na defesa da espécie em extinção do mico-leão-dourado do que dos bebês assassinados no ventre de suas mães ou se defende o vegetarianismo como se fosse uma questão ética.
Nessa dissolução total dos traços da civilização que a fé católica gerou, vemos inclusive nas correntes mais avançadas da revolução anticristã uma repulsa a tudo o que é estritamente racional e metódico, valorizando no conhecimento mais a “vivência” e "a experiência" do que o raciocínio lógico - refletindo-se, inclusive, nos métodos de ensino nas escolas e universidades. Isto tem como pano de fundo a filosofia moderna, que afirma que é impossível ao homem conhecer a verdade objetiva, e tudo é relativizado, justificando-se assim, no pensamento revolucionário, todas as suas doutrinais liberais e igualitárias - é isto que o Santo Padre Bento XVI tem denunciado como “ditadura do relativismo”, que aceita qualquer idéia...exceto a idéia de que exista uma verdade objetiva!

No campo religioso, tal posicionamento leva à adesão a formas irracionais de religiosidade, como vemos na New Age, que traz à tona diversos elementos pagãos que já haviam sido expurgados da civilização cristã, tais como o panteísmo, a astrologia, a bruxaria, o xamanismo, o misticismo oriental, a crença na reencarnação, em gnomos, a busca do contato com extraterrestres que seriam propagadores dos citados elementos religiosos, e assim por diante. Adeptos da New Age aguardam uma futura manifestação pública de um "novo messias", que viria instaurar um novo tempo que eles chamam de "era de aquário”; tal “messias’ é chamado "Maitreya" – identificado por muitos cristãos católicos e protestantes como o Anticristo bíblico (II Ts 2, 3-9).

É preciso alertar, ainda, para o perigo daqueles que, no interior da Santa Igreja, se dizem católicos, mas em maior ou menor grau, estão imbuídos das idéias liberais e igualitárias da revolução. A respeito deles, o Papa São Pio X, já em 1907, alerta: "O que exige que sem demora falemos, é antes de tudo que os fautores do erro já não devem ser procurados entre inimigos declarados; mas, o que é muito para sentir e recear, se ocultam no próprio seio da Igreja, tornando-se destarte tanto mais nocivos quanto menos percebidos." (Pascendi Dominici Gregis) Também a eles o Papa Paulo VI se referia quando afirmou: "Através de uma brecha penetrou a fumaça de Satanás no templo do Senhor." (29/06/1972) Aqui na América Latina, os que se dizem católicos, mas de forma mais extremada estão imbuídos com as idéias da revolução, estão afinados com a ideologia da Teologia da Libertação, de Leonardo Boff, Frei Betto e Marcelo Barros.



5. Contra-revolução e Nova Evangelização

A revolução anticristã vem, portanto, conduzindo nossa sociedade a um novo paganismo. É necessário, portanto, para combater tal revolução, uma ação contra-revolucionária, que implica no conhecimento claro do processo revolucionário anticristão e do combate à ele, empenhando-se na defesa da Santa Igreja, da compatibilidade entre a fé católica e a razão, da supremacia da razão sobre as emoções, da existência de uma moral objetiva, da dignidade da vida humana, da família monogâmica, da propriedade privada e da justa ordem social.

Tal processo contra-revolucionário coincide, certamente, com a Nova Evangelização convocada pelo saudoso Papa João Paulo II. Ele afirma: "A evangelização — e, portanto, a nova evangelização — comporta também o anúncio e a proposta moral. O próprio Jesus, precisamente ao pregar o Reino de Deus e o Seu amor salvífico, fez apelo à fé e à conversão (cf. Mc 1, 15). E Pedro, com os outros Apóstolos, ao anunciar a ressurreição de Jesus de Nazaré de entre os mortos, propõe uma vida nova a viver, um caminho a seguir para ser discípulo do Ressuscitado (cf. Act 2, 37-41; 3, 17-20). Tanto ou mais ainda que pelas verdades da fé, é ao propor os fundamentos e os conteúdos da moral cristã que a nova evangelização manifesta a sua autenticidade." (Veritatis Splendor, 107)

É preciso que se combata as inverdades propagadas contra Nosso Senhor Jesus Cristo, a Santa Igreja e a Idade Média (como vemos em obras antigas e atuais como "Código da Vinci"); que se combata os preconceitos que a revolução anticristã propagou contra a Santa Igreja e a tornou vista como mentirosa, desumana e irracional. É preciso apresentar a fé católica como compatível com a razão humana; a Santa Igreja como, por excelência, defensora da dignidade do ser humano e promotora de um sadio humanismo; a moral objetiva como condição para a justa ordem social; Deus como aquele que é Justo e Misericordioso, e ama infinitamente o ser humano (como enfatizou o Santo Padre Bento XVI na sua sensacional encíclica “Deus Caritas Est”). É preciso mostrar que, como o Santo Padre tem ensinado, a fé católica não é um conjunto de proibições, e sim um fascinante projeto de vida.

O caminho para a contra-revolução passa, necessariamente, pela aproximação dos contra-revolucionários e a propagação do que defendem, buscando atingir os grandes meios de comunicação (mas sem desprezar os meios menores, que certamente são caminhos para os maiores) e a conscientização daqueles que potencialmente têm maior influência na sociedade (tendo em vista que sempre foram eles que promoveram a revolução anticristã).

Correspondamos, assim, à graça que o Espírito Santo nos concede. Lembrou o Papa Paulo VI que "a evangelização nunca será possível sem a ação do Espírito Santo" (Evangelii Nuntiandi, 75) Nos abramos, portanto, a Sua ação, e assim o façamos para que se cumpra o quanto antes o Triunfo do Imaculado Coração da Santíssima Virgem, que Ela anunciou nas suas aparições em Fátima: “Por fim, Meu Coração Imaculado Triunfará”.

A Santíssima Virgem e o Apóstolo João .

No que diz respeito a Nossa Senhora, o apóstolo São João se encontra em situação privilegiada, ao confiar-lhe Jesus o cuidado de Sua Mãe quando está para morrer na Cruz. Ela estará desde então a seu lado. A João, como a nenhum outro, pôde falar a Santíssima Virgem de tudo aquilo que guardava no seu Coração (Lc 2,51).



Em Maria, diz o Evangelho, o Verbo Se fez carne. O próprio Filho do Eterno Pai faz-Se Filho do Homem, para que assim os filhos dos homens cheguem a ser filhos de Deus. O Canto da consolação,(Is 40,1-11) - falava da vinda de Deus aos que sofriam, pois Deus guiaria pessoalmente o Seu povo num novo êxodo para a Terra Prometida. Ao dizer que o Verbo Se fez carne, a figura da Mãe de Deus oculta-se discreta entre linhas. É o papel ordinário de Maria no Evangelho: passar despercebida, especialmente nos momentos de glória do Filho. Depois, como nenhuma outra criatura, participará do triunfo glorioso de Cristo, e será também, São João quem no-La descreve em todo o seu esplendor: «Um grande sinal apareceu no céu: uma mulher ves¬tida de sol, e sobre a sua cabeça uma coroa de doze estrelas» (Ap 12,21)



Em João 2,1-11 narram-se as bodas de Caná, e em 19,25-27 a presença de Maria Santíssima no Calvário. Ambos os relatos tem entre si um claro paralelismo: a Virgem é designada como a Mãe de Jesus, e o Senhor chama-lhe «Mulher». Também, tanto em Caná como no Calvário, se fala da hora de Jesus. No primeiro caso, como de algo que ainda não tinha chegado, e, no segundo, como de uma realidade já presente. Essa «hora de Jesus» marcará toda a Sua vida até culminar na Cruz (Jo 7,30; 8,20).



«Quando Ele realizou tudo o que julgou conveniente realizar - afirma Santo Agostinho-, então é quando chegou a hora assinalada: por Sua vontade e não pela necessidade, pelo Seu poder e não por exigência alguma» (In Ioam Evang.8,12).



Por seu lado, diz o Doutor Angélico que «se entende a hora da Paixão não como imposta pela necessidade, mas determinada pela divina Providência» (Comentário sobre S. João,2,3)



O que à primeira vista aparece no relato das bodas de Caná é a delicada caridade da Virgem Santíssima e a sua fé absoluta no poder de Jesus. Além disso, no fundo, significa que Maria intervém aqui, tal como no Calvário, intimamente vinculada à Redenção messiânica. Assim, Jesus ao converter em vinho a água destinada às purificações rituais dos judeus, insinua o começo dos tempos messiânicos. Com efeito, o vinho simboliza nos oráculos proféticos os tempos do Messias, quando os lagares estarão repletos de bom vinho (Am 9,13), e no monte Sião se celebrará um banquete de manjares suculentos e de vinhos olorosos (Is 25,6).





O próprio Jesus fala do fruto da videira que se beberá no Reino (Mt 26,29), e contrapõe o vinho novo ao vinho velho (Mc 2,22). Por outro lado, o banquete das bodas de Caná evoca o banquete dos desposórios de Yahwéh com a filha de Sião, que significa a Antiga Aliança, (Is 54,4-8) assim como os desposórios de Cristo com a Igreja significam a Nova Aliança (Ef 5,25) aludidos também em algumas parábolas . Assim, pois, a figura da Santíssima Virgem e as palavras que se referem a ela há que contemplá-las à luz do sentido messiânico de toda a perícopa.



São João contempla a Maternidade divina de Maria em toda a sua plenitude, sendo Mãe não só da Cabeça mas também de todos os membros do Corpo Místico de Cristo. Por isso, em vez do nome de Maria, no quarto Evangelho utilizam-se os títulos de «Mãe de Jesus» e de «Mulher», que têm um significado peculiar, relacionado com a sua maternidade espiritual; neste sentido chama Jesus em Caná a Sua Mãe «Mulher» (Jo 2,4).



E igualmente em 19,25-27, onde o Evangelho fala da presença de Nossa Senhora no Calvário; aqui, como em Caná, as palavras do Senhor têm um sentido mais profundo do que à primeira vista poderia parecer. Depois de ter confiado a João o cuidado de Maria, Jesus dá por consumada a Sua missão antes de morrer (19,28); então «já» estava tudo cumprido e não antes.



A proclamação de Maria como Mãe do discípulo amado entra, pois, a fazer parte da obra salvífica, que, nesse momento, fica consumada. Portanto, além de um ato de piedade filial, trata-se de algo mais transcendente: a maternidade espiritual de Maria. Este é o momento em que a corredenção da Virgem Mãe adquire toda a sua força e sentido. Agora sim que advertimos como Maria esteve unida com Jesus, agora a maternidade divina de Nossa Senhora atinge toda a sua magnitude, agora a Virgem Santíssima é constituída Mãe espiritual de todos os crentes. O discípulo amado representa aqueles que seguirão o Mestre e no apóstolo João recebem Maria Santíssima como Mãe.



A palavra «Mulher» implica, além disso, certa solenidade e ênfase: a maioria dos autores inclinam-se à ver neste título uma clara alusão ao «proto-evangelho» (Gen 3,15),onde se fala do triunfo da mulher e da sua linhagem sobre a serpente. Tal alusão, além de estar avalizada pelo próprio texto (o uso do termo «Mulher»), é confirmada pelas interpretações dos Santos Padres, que falam do paralelismo entre Eva e Maria, semelhante ao que se dá, entre Adão e Cristo (Cfr Rom 5,12-14). Efectivamente, na Morte de Cristo temos o triunfo sobre a serpente, pois Jesus ao morrer redime-nos da escravidão do demônio.



"Mors per Evam, vita per Mariam, a morte veio-nos por Eva, a vida por Maria" (S. Jerônimo, Epistola ad Eustochium, PL 22,408).



«A primeira Eva _ ensina Santo Ireneu - desobedeceu a Deus, a segunda, pelo contrário, obedeceu-Lhe; assim a Virgem Maria pôde ser advogada da virgem Eva» (Adversus haereses,5,19,1).



Nossa Senhora «cooperou de modo singular, com a sua fé, esperança e ardente caridade, na obra do Salvador, para restaurar nas almas a vida sobrenatural. É por esta razão nossa mãe na ordem da graça» (Lumem Gentium, n.61). Assim Ela «continua no céu a exercer a sua missão maternal com os membros de Cristo, pela qual contribui para gerar e aumentar a vida divina em cada uma das almas dos homens redimidos» (Credo do Povo de Deus, n.o 15. )



Comenta Orígenes: «Atrevemo-nos a dizer que a flor das Escrituras são os Evangelhos e a flor dos Evangelhos é o de São João. Mas ninguém saberá compreender o seu sentido se não repousou no peito de Jesus e recebeu Maria como Mãe. Para ser como João, é preciso poder, como ele, ser mostrado por Jesus como outro Jesus. Com efeito, se Maria não teve outros filhos além de Jesus, e Jesus diz a Sua Mãe: 'Eis aí o teu filho' , e não 'eis aí outro filho', então é como se Ele dissesse: Aí tens Jesus, a quem tu deste a vida'. Efectivamente, qualquer pessoa que se identificou com Cristo já não vive para si, mas Cristo vive nele (cfr GaI2,20), e visto que nele vive Cristo, dele diz Jesus a Maria: 'Eis aí o teu filho: Cristo'» (In Ioann. Comm., 19,26-27. 138 Rom 6,1-14.)



Recebemos pelo Batismo, pela participação na Morte e Ressurreição de Cristo (Rom 6,1-14), o dom da filiação divina (Jo 1,12-13), mas para chegar a viver essa identificação com Jesus «é preciso unirmo-nos a Ele pela fé, deixando que a Sua vida se manifeste em nós, de maneira que se possa dizer que cada cristão é, não já alter Christus, mas ipse Christus, o próprio Cristo!» (Cristo que passa, n. 104).

Fonte: Introdução ao Evangelho segundo São João – Bíblia de Navarra – Edições Theologica – Braga – 1994 – pag.1109 – 1113.

Os Padres da Igreja e a Mariologia

A Mariólogia¹ tem sua origem nas raízes do Cristianismo, o primeiro a mencionar aspectos mariológicos e pontos sob a figura de Maria no plano de Salvação em Cristo e a estudá-la foi Santo Ireneu de Lião (†202) Grande Pai Ocidental da Igreja em sua obra; “De Recapitulacionae” explica-nos; é o primeiro a declarar Maria como a nova Eva mãe do novo Adão; mais tarde muitos outros Pais da Igreja, demostraram em suas obras a devoção e piedade cristã que deste dos primeiros crentes tinha-se por Nossa Senhora, fato que herdou a Teologia Católica com o estudo Mariológico fazendo compreender “A missão de Maria na História da Salvação” (BOFF, Clodovis. 2009, p.11).



“As etapas da salvação da humanidade são percorridas no sentido inverso ao da queda, desligando-se progressivamente, os laços das últimas até as primeiras [...] É assim que o laço da desobediência de Eva, sem pecado, mas que peca, é desligado pela obediência de Maria, [...]”.

Mais tarde os padres da Igreja o apoiarão como, por exemplo, no século II, poderíamos citar também S. Justino, (†165); Santo Ireneu (†202) ao qual relacionamos acima: Tertuliano de Cartago, (†220) S. Atanásio, (295-373) Santo Efrém (†373), Escreveu belos hinos de louvor a Maria São Cirilo de Jerusalém (†386); São Cirilo de Alexandria (†444) Doutor Mariano;

Dentre os decorreres dos séculos a figura Mariana entre os Padres da Igreja ficará cada vez mais forte;

Orígenes: afirma; (184-254)

“Maria tem dois filhos, um, homen-Deus e o outro puro homem; de um Maria é Mãe corporal, do outro, Mãe espiritual” (Speculum B.M.V., lect. III art. 1,2º )

Santo Agostinho (354-430) diz;

“A Santíssima Virgem é o meio de que Nosso Senhor se serviu para vir a nós; e é o meio de que nos devemos servir para ir a ele.” (Santo Agostinho Sermo 113 in Nativit. Domini).

São Leão Magno [Grande]:(400-461) diz;

“Digo com os Santos: Maria Santíssima é o paraíso terrestre” (S. Leão Grande; Sem. de Annuntiatione)

São Germano de Constantinopla - (610-733) Diz;

“Pois ninguém fica cheio do pensamento de Deus se não for por ela” (S. Germano de Constantinopla : Sermo 2 in Dormit.)

São Ildefonso de Sevilha (†636) diz;

“Eis por que, quanto mais, em uma alma, ele encontra Maria, sua querida e inseparável esposa, mais operante e poderoso se torna para produzir Jesus Cristo nessa Alma, e essa alma em Jesus Cristo.” (S. Ildefonso, Líber de Corona Virginis, cap. III).

S. João Damasceno (675-749) este que em suas inúmeras obras falou e ensinou muito a respeito de Nossa Senhora diz;

“Tudo que convém a Deus pela natureza, convém a Maria pela graça.” ( Sermo 2 in Dormitione B. M.).

“Prendemos, as almas à vossa esperança, como a uma âncora firme”: (S. João Damasceno; Sermo 1 in Dormitione B. M.V.)

“Ser vosso devoto, ó Virgem Santíssima, é uma arma de salvação que Deus dá, aqueles que quer salvar.” ( São João Damasceno).

“Os olhos não viram, o ouvido não ouviu, nem o coração do homem compreendeu as belezas, as grandezas e excelências de Maria, o milagre dos milagres da graça” (S. João Damasceno, Oratio I de Nativitati B. V.).

S. Gregório Palamás Padre oriental do séc. VIII, em uma de suas Homilia sobre a Mãe de Deus diz;

“Se por um lado, Maria concede a Deus entre os homens, por outro, o Senhor encarna numa virgem Imaculada que está acima de toda a pureza e de toda a santidade”.

A Santa Tradição Apostólica confirmada pelos Pais da Igreja reconhece em Maria, a nova Eva:

Eva foi causa de morte para si e Adão, e para todo homem ao olhar para traz e ouvir o tentador, introduzindo na humanidade o pecado pela desobediência e pelo orgulho as próximas gerações, a segunda Eva Maria, torna-se causa de salvação para si e para humanidade por causa do seu sim (obediência) a Deus, introduzindo a Redenção e a vida, ao homem, por que na sua humildade traz ao mundo a Graça que só ela tinha achado, volto-se e fincou os olhos em Deus. (Santo Ireneu de Lião. Séc. II).

Notas:

Mariologia¹: Matéria teológica pertencente à Teologia Dogmática, estudo dedicado ao estudo da pessoa, lugar e importância de Maria, em âmbitos teológicos como a encarnação do verbo e seu plano soteriológico e junto a Redenção operada por Cristo (Cristológico). Além do papel e devoção apresentada a Mãe de Jesus na Igreja desde seu inicio.

Referencias:

[1] BOFF, Clodovis. Introdução à mariologia. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2009

[2] São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem. 19ª Edição. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 1992.

A veneração dos santos através de uma perspectiva bíblica .

Começamos em Hebreus 11, versiculo 1: "A fé é uma posse antecipada do que se espera, um meio de demonstrar as realidades que não se vêem. Foi por ela que os antigos deram o seu testemunho. Foi pela fé que compreendemos que os mundos foram organizados por uma palavra de Deus. Por isso é que o mundo visível não tem a sua origem em coisas manifestas."

Aí São Paulo começa a citar um por um dos grandes santos da família de Deus do Antigo Testamento começando com o primeiro mártir, Abel, que tinha oferecido um sacrifício aceito por Deus. E depois Henoc e Noé e Abraão, Isac, Jacó e Sara. Depois continua a falar de Abraão, Isac e Jacó, e todo o sofrimento que eles passaram por que a esperança deles não estava na Jerusalém terrena, mas na Jerusalém celeste; não na terra prometida terrena, mas na celeste.

Então no versículo 23 ele fala sobre Moises e tudo o que ele renunciou para ganhar esta herança gloriosa no céu; e da mesma forma, Israel. E depois Raab, a prostituta de Jericó: até mesmo a fé dela é exaltada. Depois Gedeão, Barac, Sansão, Jefté, Davi, Samuel e os profetas que pela fé conquistaram reinos, receberam promessas, deteram as bocas de leões e acabaram com fogueiras devastadoras, escaparam da espada, tiraram fortaleza da fraqueza, tornaram-se poderosos na guerra, fizeram os exércitos inimigos fugir. Todos os grandes feitos são relembrados não só para passar pela história mas principalmente, como você verá, para inspirar uma fé, esperança e amor maiores em nós.

No versiculo 36: "Outros ainda sofreram a provação dos escárnios, experimentaram o açoite, as correntes e as prisões. Foram lapidados, foram serrados e morreram assassinados com golpes de espada. Levaram vida errante, vestidos com peles de carneiro ou pêlos de cabras; oprimidos e maltratados, sofreram privações. Eles, de quem o mundo não era digno, erravam pelos desertos e pelas montanhas, pelas grutas e cavernas da terra. E não obstante, todos eles, se bem que pela fé tenham recebido um bom testemunho, apesar disso não obtiveram a realização da promessa. Pois Deus previa para nós algo de melhor, para que sem nós não chegassem à plena realização."

Assim, de certa maneira, o advento de Cristo e da economia da Nova Aliança trouxeram uma benção e glória para estes santos do Antigo Testamento maior do que a que eles receberam quando morreram. Algo novo foi inaugurado quando Cristo ressuscitou, quando ele subiu aos céus e quando subiu ao trono. Ele abriu um novo panorama, uma nova porta, a porta de entrada para o céu, para que seus irmãos viessem pra casa. Nós veremos mais adiante como foi colacado neste reino glorioso no céu tronos e neles estão sentados este grandes santos, bem como os santos da Nova Aliança. E eles são sacerdotes, eles testemunham para servir a Cristo e para rezar em nosso favor.

Mas observe que o autor de Hebreus relembra tudo isto para nos inspirar a seguir o exemplo deles. Isto vai ser uma consideração fundamental para entender a base lógica bíblica para a veneração dos santos. Exemplos heróicos inspiram virtudes heróicas. Vejamos Hebreus 12: "Portanto" (um dos mais básicos princípios interpretativos de estudos biblicos, sempre que aparecer a palavra, "portanto", pergunte a si mesmo o que vem a seguir pois basicamente há um resumo de tudo o que foi dito anteriormente e encerra com uma conclusão prática, especialmente na carta aos Hebreus.) "Portanto, também nós, com tal nuvem de testemunhas ao nosso redor, rejeitando todo fardo e pecado que nos envolve, corramos com perseverança para o certame que nos é proposto, com os olhos fixos naquele que é o autor e realizador da fé, Jesus, que, em vez da alegria que lhe foi proposta, suportou a cruz, desprezando a vergonha, e se assentou à direita do trono de Deus. Considerai, pois, aquele que suportou tal contradição por parte dos pecadores, para não vos deixardes fatigar pelo desanimo. Vós ainda não resististes até o sangue em vosso combate contra o pecado. Vós esquecestes a exortação que vos foi dirigida como a filhos?"

E ele continua a falar sobre a disciplina de Nosso Senhor e a castidade e sofrimento que é próprio aos filhos de Deus para amadurecer e crescer. Então no versículo 12: "Por isso, reerguei as mãos enfraquecidas e os joelhos tropegos; endireitai os caminhos para os vossos pés, a fim de que não se extravie o que é manco, mas antes seja curado."

Todo o quadro em Hebreus 12 é uma grande corrida e quem está na multidão? Todos os santos. E o que eles compõem? Versiculo 1, "uma nuvem de testemunhas". O que se quer dizer com nuvem? Bem, se você fizer um pouquinho de estudo de fundo biblico, esta nuvem é a mesma nuvem que se pode rastrear de volta ao Antigo Testamento. É a a nuvem de glória em que Moisés subiu no Monte Sinai. É a mesma nuvem que cobriu Jesus quando ele ascendeu aos céus diante dos olhos dos discípulos. Esta nuvem de uma certa forma é uma manifestação portátil daquilo que é como estar "movido pelo Espírito" como João no livro do Apocalipse: "No dia do Senhor fui movido pelo Espírito", e esta nuvem de glória agora está repleta de nossos irmãos e irmãs mais velhos. E eles constituem uma nuvem de testemunhas, não é apenas uma nuvem que vai e vem conforme sopra o vento. É uma nuvem que é uma multidão com o objetivo de nos animar.

Quando o time1 joga em casa, as chances são maiores dele ganhar o jogo. Por quê? Porque os seus torcedores estão lá. Você pode dizer que é porque eles conhecem melhor o campo. Pode ser. Mas existe sempre um limite psicológico incrível especialmente em jogos de campeonato.

Sempre se tem uma chance a mais quando se joga em casa. E aqui nós jogamos em casa e tem uma enorme nuvem de testemunhas, todos os nossos familiares mais velhos estão torcendo por nós, nos animando. Você pode ver nas mãos e nos pés destas pessoas que levantam as mãos, que nos animam e nos olham, feridas e cicatrizes, em seus rostos e em suas costas. Você sabe que eles participaram do jogo e estão nos chamando para fazer o mesmo.

E o maior e mais barulhento animador de todos é o próprio Jesus, o pioneiro e o aperfeiçoador de nossa fé, o primogênito entre muitos irmãos e irmãs, conforme nos conta Romanos 8. Todo um estádio está repleto com nossa família. E inspira ardor e coragem, vigor e sacrificio. E sabe o que mais? O autor de Hebreus jamais considera por um segundo sequer argumentar isto. Ele crê e ele pensa que devemos crer também, mas que devemos meditar a respeito e nos inspirarmos.

Agora se os santos não sabem o que nós estamos fazendo, e nós não temos idéia do que eles estão fazendo, ou seja, se não temos nenhum contato, nenhuma comunicação, este tipo de descrição é apenas uma metáfora simplesmente fraca e estranha. Mas não é este o caso. Esta é a realidade espiritual compreendida com os olhos da fé, os olhos que estão abertos para as verdades espirituais desta grande declaração do Credo: "Creio na comunhão dos Santos".

Agora não é só porque todos nós acreditamos na mesma coisa que temos este sentimento bom e real mas sobrenatural de que todos estamos unidos por este laço de confissão doutrinária e culto litúrgico. É muito mais do que isso. É mais do que somente ser um companheirismo de pessoas que pensam da mesma forma. Nós dizemos, "Eu creio no Espirito Santo", e é por isso que cremos na santa Igreja Católica, porque sem o Espirito Santo, nós só seríamos mais uma organização humana. Mas o Espirito Santo - ensina a Igreja - é a alma da Igreja. O Corpo Mistico de Cristo é animado e obtém vida sobrenatural do Espírito Santo. Assim dizemos, "Eu creio no Espirito Santo, na santa Igreja Católica - e o quê mais? - na comunhão dos Santos".

Agora como é que se pode ter comunhão com pessoas com as quais não se tem nenhuma comunicação? Como se pode possivelmente estar em comunhão com pessoas com as quais não partilhamos nada em comum juntos em termos de experiência diária? Eu não estou dizenho que Nosso Senhor nos tenha dito para termos conversações diárias. Certo, algumas pessoas são dotadas de revelações místicas. Mas sempre que alguém disser: "Bem, você está se comunicando com os mortos e isto é pecado julgado pelo Antigo e pelo Novo Testamento porque isto é divinização, isto é feitiçaria ou sei lá o quê", você responde: "Eles não estão mortos. Eles estão mais vivos do que nós. Benditos aqueles que morreram no Senhor". Por quê? Porque suas obras os acompanham ao céu. Os santos do Antigo Testamento tiveram que esperar pelo Messias, mas esta espera já passou. Aqueles santos martirizados estão com Nosso Senhor e com uma multidão, e eles torcem por nós. Nós não precisamos só olhar com fé, mas ouvir com fé.

A veneração dos santos não transgride a situação de Cristo nosso único mediador

Quero dizer mais uma coisa antes de continuar: eu quero que vocês saibam que os santos não são uma rota alternativa para se chegar até Deus. Se você pensa que sim, então pare de rezar para os santos até que você tenha sua vida espiritual reajustada de volta ao curso normal, porque você não é um bom católico. O fato é que existe um único mediador entre Deus e o homem, que é o homem Jesus Cristo. Paulo não poderia ter deixado isto mais claro em Timoteo. Ele diz: "Há um só mediador entre Deus e os homens, um homem, Cristo Jesus".

Vejamos o que diz Timoteo. 1 Tim 2, 5: "Há um só Deus, e um só mediador entre Deus e os homens, um homem, Cristo Jesus, que se deu em resgate por todos". Agora que conclusões podemos tirar disto? Podemos concluir falsamente que porque nós temos um mediador, logo estamos enfraquecendo o trabalho de Cristo ao pedirmos para os santos intercederem a nosso favor? Não, claro que não. Esqueça o fato de que os santos são cristãos que estão no céu, nós temos ciência do fato de que os cristãos da terra são constantemente chamados de santos no Novo Testamento. Isto é o que nós somos. Isto é o que nós devemos nos tornar, e se continuarmos em frente e nos mantermos firmes na fé, isto é o que seremos por toda eternidade. Mas somos santos se estivermos em Cristo.

Agora, católicos ou não, se alguém vos pedir para rezar por eles, para interceder por eles à Deus, vocês sairão por aí dizendo: "Como se atreve a debilitar a única mediação de Jesus Cristo, o único Sumo Sacerdote?". Claro que não. Por quê? Porque o que diz Paulo nos primeiros quatro versiculos anteriores a 1Tim 2, 5?: "Eu recomendo, pois antes de tudo, que se façam pedidos, orações, súplicas e ações de graças, por todos os homens". Só através de Jesus? Claro que não. Por nós, "pelos reis e todos os que detêm a autoridade, a fim de que levemos uma vida calma e serena, com toda piedade e dignidade. Eis o que é bom e aceitável diante de Deus, nosso Salvador, que quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade. Pois há um só Deus, e um só mediador entre Deus e os homens".

Eu costumava citar este texto fora do contexto e usava-o para minar a veneração devida aos santos que está enraizada em duas coisas: pedir-lhes por intercessão e súplica, e ser inspirado a seguir o exemplo deles. Nós podemos adicionar uma terceira que é, honrá-los. Nós os glorificamos quando nós os veneramos. E por quê? Porque nós ficamos entediados após dez ou quinze horas honrando a Cristo? Não. É precisamente porque nós honramos a Cristo. É precisamente porque nós imitamos Cristo. Nós imitamos Cristo, então se O vemos honrando aqueles que morreram pela verdade, aqueles que professaram a fé com muito sofrimento, nós fazemos aquilo que Cristo faz e glorificamos aqueles que Ele glorifica. Aqueles que Ele bendiz, nós bendizemos.

É bem simples. Só quando inconscientemente reduzimos a fé cristã a um relacionamento individualista - Jesus e eu - é que começa a se tornar uma coisa tipicamente americana auto-centrada. Quero dizer, encaremos: a familia americana não é um grande exemplo de laços fortes de comunicação atualmente. E tem sido assim por séculos. Você sabia que Daniel Boone era um dos piores pais? ... Grandes heróis americanos, fortes individualistas, não eram grandes homens de família. Você devia ouvir o que a mulher de John Adams tem a dizer - uma feminista radical... Ela não estava mais preocupada com o matrimônio, com a família, o lar e a América. Ela estava preocupada com os direitos do indivíduo que ela pudesse exercer e que outros pudessem exercer e, caso contrário, que eles pudessem conseguir a força. Este é o jeito americano.

Como se costumava dizer no século 18: "Não servimos a nenhum governante"; nenhum rei, e reis eram sempre figuras paternas. Eu não estou argumentando a favor de monarquia política e política natural porque o pecado humano é o que é. Mas nós temos uma monarquia sobrenatural, um reino celeste, uma figura paterna distante do pecado que concede sua vida e graça pura aos nossos irmãos e irmãs mais velhos, seus filhos. E este reino é o Reino do Céu. E isto nos inspira de uma forma muito maior a servir a nosso Soberano e a servir ao seu gabinete de ministros e príncipes e princesas que ele nos outorga.

Você percebe como é difícil para os americanos pensar e agir deste modo?2 Quando tudo em nossa cultura segue na direção contrária? A quem nos curvamos em nossa sociedade? Ninguém. E mesmo quando dizemos: "Your Honor" (=Vossa Excelência) para um juiz ou "Your Excellency" (=Vossa Eminência) para um arcebispo, parece uma coisa não natural, nos arrepiamos, não arrepiamos? Não é americano. "Quem você pensa que é?"

Mas o fato é que numa família, não é a pessoa tanto quanto o ofício que nós veneramos e honramos. E é isto que fazemos quando nós veneramos os santos. Nós estamos imitando Cristo que os honra. Por nossa vez, nós queremos imitar os santos no serviço à Cristo.

"We Are Family" (=Somos uma família) - constumava cantar o grupo Sister Sledge muitos anos atrás (final dos anos 70). Nós somos a família de Deus. Nenhum pai vai se sentir traído ou ignorado ou rejeitado quando os irmãos e irmãs se amam e inspiram uns aos outros no sacrifício e serviço corajoso pelo nome da família. É até mesmo bobo quando se coloca desta forma, mas que outros termos bastariam para o que a Santíssima Trintada, a Família Divina, têem feito por toda a história? É a única forma que faz sentido. É a única forma que engloba toda a Biblia. É a única razão pela qual Paulo em 1Tim 2, 5 considera um mediador e ainda diz o que diz em 1Tim 2, 1-4: "Pois, porque há um só mediador, nós podemos fazer orações, súplicas e pedidos com uma confiança maior, por todos os homens", até mesmo para os reis, para os ricos e prósperos, e para os corruptos. Por quê? Porque só há um mediador, o Homem-Deus, Jesus Cristo.
Poderíamos enlouquecer fazendo orações como jamais tínhamos feito antes. Por quê? Porque só há um mediador. Será que isto significa que não haja outros intercessores, outros a quem fazer súplicas? Não! Claro que não. Só há um mediador e porque nosso mediador é o mais fabuloso que nós podemos imaginar, nós temos agora a capacidade de interceder como sacerdotes no Sacerdote, como filhos no Filho, como pastores no único Pastor. Nós obtemos vida Dele. "Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim. Longe de Cristo nada posso fazer". Mas comigo, diz Jesus, você pode tudo. "Para Deus tudo é possivel".

Apoio bíblico para o fato de que Deus ouve os clamores dos santos

Precisamos ajustar nosso pensamento. Isto não é novo. Desde o Genesis, existe um tipo de alusão misteriosa ao fato de que Deus está em contato com as necessidades dos mártires. Em Gen 4, 10, Deus diz a Caim: "Ouço o sangue de seu irmão, do solo, clamar para mim!" Agora, você acha que se você saisse no campo e encontrasse o lugar onde todo aquele sangue foi derramado, colocasse seus ouvidos no chão, você ouviria uma voz? Não, eu acho que não. Não, isso é um dispositivo literário. O sangue de Abel é a alma de Abel que tinha acabado de morrer. Ela não estaria clamando por coisa alguma a não ser que Abel tenha sido justificado por Deus de alguma maneira. De alguma maneira que nós desconhemos, pode ser o seio de Abraão, como nós vemos em Lucas 16, 23.

Deus ouve, a qualquer preço, o clamor daqueles santos martirizados desde o princípio. O sangue é a vida, a vida é a alma e a alma clama por vingança e Deus responde. É por isso que Hebreus 12, 24 refere-se a isto comparando o sangue de Abel clamando por vingança ao sangue jorrado de Jesus que fala mais eloquentemente do que o de Abel. Agora, falaria o sangue de Jesus conosco? Bem, de certa forma, não. Não é o sangue, mas a vida da alma representada pelo sangue que está falando "misericordia, misericordia, misericordia" em nosso favor. Não vingança, mas perdão, porque Cristo não foi morto por um irmão no meio do campo contra a sua vontade. Cristo entregou Sua própria vida como resgate de todos. Assim, o Seu sangue fala da mesma forma que o sangue de Abel, mas ele fala de uma maneira maior e mais eloqüente.

Agora eu gostaria de sugerir que o tipo de pregação que encontramos em Lucas 16 não teria vindo dos lábios de Jesus se este ponto de vista não fosse comum. Vejamos Lucas 16, 19-31. Ali, é claro, nós encontramos a famosa estória de Lázaro e o homem rico. Ela nos diz que Lázaro era bastante pobre, e que os cães lambiam suas feridas quando ele se sentava na porta do rico; ao morrer foi carregado ao seio de Abraão. O outro homem, o rico, foi carregado em meio a tormentos, à mansão dos mortos. Ele exclamou: "Pai Abraão, tem piedade de mim". Isto não é exatamente o clamor da alma desprezível, condenável, endemoniada cuja maldade e pecado são só aperfeiçoados. "Tem piedade de mim, Pai": ele sabe que pertence àquele lugar, mas agora ele não pede por justiça, mas por misericórdia. Ele não está dizendo: "Me tira daqui, este não é o meu lugar. Me tira daqui. Eu tenho que voltar. Eu mereço uma segunda chance".

Ele diz: "Manda que Lázaro molhe a ponta do dedo para me refrescar a língua, pois sou torturado nesta chama". É por isso que eu sugiro que isto pode muito bem se referir, não ao fogo do inferno e ao tormento eterno, mas ao fogo do purgatório da alma que por negligência das obras corporais de misericórdia termina no curso de verão por um longo tempo3. Ele exclama: "Pai Abraão, tem piedade de mim". E Abraão responde: "Filho"; ele não diz: "seu condenado maldito", "filho de Satanás", "verme desprezível", "sua víbora". Não, "Filho", é o que Abraão responde. "Lembra-te de que recebestes teus bens durante tua vida". E o homem não diz: "O que você quer dizer com, 'lembra-te'?". Quando a alma morre, ela não se lembra de nada. Ela não se lembra de ninguém. Mas ele se lembra do que Abraão estava falando; ele se lembra.

E continuando no versículo 27: "Pai, eu te suplico, envia então Lázaro até à casa de meu pai". Ele se lembra da casa de seu pai! "... pois tenho cinco irmãos". Ele não somente se lembra que tem cinco irmãos; ele está bastante preocupado com eles. Ele está intercedendo em favor dos cinco irmãos, "para que (Lázaro) leve a eles seu testemunho, para que não venham eles também para este lugar de tormento". Ele não diz: "Abraão, você pode dar uma amostra aos meus irmãos do meu destino torturante aqui nas chamas?" Ele diz: "Você ressuscitará Lázaro. Você o mandará de volta dos mortos?" Que pequeno favor a se pedir da parte de Lázaro! Certamente seria uma justificação para o pobre homem, não seria?

Mas Abraão diz: "Eles têm Moisés e os Profetas; que os ouçam". E ele responde: "Não, pai Abraão, mas se alguém dentre os mortos for procurá-los, eles se arrependerão". E Abraão responde: "Se não escutam nem a Moisés nem aos Profetas, mesmo que alguém ressuscite dos mortos, não se convencerão". Fim da estória. Agora, você pode dizer: "Então, eles podem fazer orações no purgatório, mas elas não são atendidas". Mas observe uma coisa. Jesus ressuscitou um homem chamado Lázaro depois de quatro dias. Esta pode ser uma parábola, mas Jesus não disse "Deixe-me contar-lhes uma parábola". Não existe nenhuma evidência de que seja uma parábola. Você pode não querer acreditar, mas em nenhum lugar, em nenhuma parábola de Jesus ele dá nome aos personagens.

Aqui Ele dá nome ao homem e Ele dá a ele o nome de um de Seus melhores amigos, Seu único amigo que ele ressuscitou dos mortos. Um homem que estava doente - que coincidência! Talvez sim, talvez não. Mas eu gostaria de sugerir que, se um homem em tormento pode se comunicar de acordo com suas próprias necessidades, quanto pode Lázaro ajudar? Em outras palavras, aqui nós temos uma situação onde o homem pode comunicar-se e interceder por aqueles que ele quer ajudar.

Agora, se um homem nas chamas pode fazer isso, o quanto podemos presumir que Lázaro tem uma lembrança clara de sua amada família na terra e que ele provavelmente tem uma percepção clara das suas necessidades? E com um amor perfeito, ele teria uma capacidade maior de interceder por estas necessidades. Talvez você negue isto, mas que passagem da Escritura você mostra para negar isto? Eu não consegui encontrar nenhuma quando eu pensava assim também.

Os católicos precisam ter uma percepção balanceada sobre o que significa a veneração dos santos

Continuando... Antes de olhar em algumas passagens, deixe-me perguntar, e pense a respeito disto quando você estiver conversando com não-católicos: porque eu devo confessar e me desculpar por todas as vezes que meus irmãos e irmãs não-católicos, apesar de separados, mas irmãos e irmãs pelo batismo, eu tenho que me desculpar porque eles ficam sabendo de muitos católicos que fazem coisas estranhas, como um ex-católico cuja mãe tem uma imagem de Maria em tamanho natural que ela veste e desveste todo dia. Ela não tem nenhuma vida de oração. Ela nunca lê a Bíblia, mas ela constantemente veste e desveste sua imagem.

Agora, eu não vou fazer nenhum julgamento final sobre este comportamento, mas vou dizer que se isto é tudo o que você tem, está desforme. E com frequência católicos não só não tem uma percepção equilibrada do que é a veneração dos santos com relação a Cristo como eles têem pouca capacidade de articular o que eles realmente estão fazendo caso tenham um percepção equilibrada. Por que eles de fato fazem isto?

Diga a um não-católico: "Você tem família? Você os ama? Você carrega as fotos deles na sua carteira? Estas imagens são ídolos?" - "Bem," - eles podem dizer - "eles não são estátuas. Eles não são pinturas. Eu não as beijo". Bom, mas, fotografia é uma tecnologia moderna que faz com seja mais fácil e móvel, você sabe, de tal maneira que se pode ter na carteira as imagens de uma família; mas o meu ponto é que ninguém cultua a foto. Explique desta maneira. Você não adora a foto. Você nem mesmo a glorifica. Percebe? Nós não glorificamos estátuas. Nós não veneramos pinturas ou ícones. Nós glorificamos e veneramos as pessoas reais que estão representadas pelas estátuas, pinturas e ícones.

Bem, mas eles estão mortos! Não, eles estão mortos em Cristo e portanto estão vivos e são benditos. Apocalipse 14 nos conta que eles são benditos se eles morrem em Cristo. Jesus prometeu a Pedro as chaves do Reino que tem poder sobre os portões do Inferno. Assim, a Igreja pode exercer esta jurisdição não somente em liberando as almas pelos méritos que Cristo derrama em seu Corpo Místico mas também reconhecendo e pronunciando oficialmente o fato de que estas almas morreram em Cristo e que podem ser veneradas, e que elas são beatificadas porque são abençoadas por Cristo.

Católicos não adoram estátuas e pinturas e ícones. A estátua é somente um pedaço de gesso ou mármore, se for realmente boa. Elas são apenas dispositivos artísticos, úteis para nos relembrar da pessoa, o acontecimento, a ocasião representada; para nos conectar em comunhão, para nos inspirar pelo seus exemplos. Assim sendo, a Escritura ensina que não há comunhão entre os santos que estão em Cristo no céu e os santos que estão em Cristo aqui na terra? Ou melhor, a doce comunhão mística que nós temos com aqueles que descansam é uma comunhão real? Claro que é. A Escritura ensina que depois da morte os santos perdem toda a memória da vida terrena, das relações e necessidades terrenas, ensina que eles perdem o interesse e a preocupação? Que eles estão tão em êxtase e focalizados em Cristo que eles nem mesmo se enxergam? A Escritura não ensina isso. A Escritura não ensina que eles perdem toda a capacidade de fazer orações, de interceder e de suplicar por nós.

Arqueólogos têm evidências sobre a Veneração dos Santos no Primeiro Século

A Escritura nos mostra que os santos se recordam de suas vidas aqui na terra e fazem orações por aqueles com os quais eles viveram? Os santos nos cercam como membros de uma família numa multidão como vimos em Hebreus 12. Eu vou apenas mencionar o fato de que inscrições nas catacumbas do primeiro século encontradas por arqueólogos neste século, que datam desde o tempo da segunda e terceira geração depois de Cristo e dos apóstolos, dão um testemunho claro deste costume antigo de venerar e pedir a intercessão dos santos. Uma inscrição diz "Pedro e Paulo, rogai por Victor". Uma outra: "Pedro e Paulo, lembrai-vos de Zozamon". Existem várias outras iguais a estas. Elas não são estranhas. Elas não são esquisitas. Elas são típicas.



A Escritura mostra que os Santos se lembram de suas vidas na terra e fazem orações por aqueles com os quais eles viveram


Observe no livro do Apocalipse que existem três classes de santos que são destacados como tendo um papel especial no rito celestial. Primeiro de todos, os mártires com vestes brancas. Segundo, as virgens e terceiro, os confessores. Por exemplo, em Apocalipse 6, 11, começando no versículo 9: "Quando abriu o quinto selo, vi sob o altar as vidas dos que tinham sido imolados por causa da Palavra de Deus e do testemunho que dela tinham prestado. E eles clamaram em alta voz: 'Até quando, ó Senhor santo e verdadeiro, tardarás a fazer justiça, vingando nosso sangue contra os habitantes da terra?'". Eles estão pedindo por justiça. Eles têm comunhão com Deus. Eles estão defendendo a causa do Corpo Místico de Cristo.

"A cada um deles foi dada, então, uma veste branca e foi-lhes dito, também, que repousassem por mais um pouco de tempo, até que se completasse o número dos seus companheiros e irmãos, que iriam ser mortos como eles". Em outras palavras, foi lhes dito sobre o que estava acontecendo, na terra. Não só sobre o que estava acontecendo naquele momento, mas o que iria acontecer no futuro. Isto é, vocês serão justificados em pouco tempo mas mais martírios precisam primeiro acontecer. Pelo menos eles tem algum tipo de consciência geral de que existe um pequeno período de tempo no qual mais mártires serão reunidos e então no fim desde pequeno período de tempo, a justificação virá. Eles têm conhecimento. Eles têm preocupação. Eles têm a capacidade de interceder e eles também têm um conhecimento maior do que o povo na terra e este conhecimento vem de Deus. Por quê? Porque eles são benditos. Apocalipse 22, 14 nos conta isso.

No final do Apocalipse esta beatitude é pronunciado sobre eles: "Felizes os que lavam suas vestes". O que quer dizer "lavam suas vestes"? Em outras palavras, eles tiveram tempo para ir até a lavanderia antes que Deus os chamasse? Claro que não. "Felizes os que lavam suas vestes", se refere a Apocalipse 7, 13. Eu sei que eu estou fazendo vocês folhearem a Bíblia pra frente e pra trás. Mas os cristãos não-católicos realmente conhecem a Bíblia deles. Nós temos que aprender a nossa.

Apocalipse 7, 13: "Um dos Anciãos tomou a palavra e disse-me: 'Estes que estão trajados com vestes brancas, quem são e de onde vieram?' Eu lhe respondi: 'Meu Senhor, és tu quem o sabe!' Ele, então, me explicou: 'Estes são os que vêm da grande tribulação: lavaram suas vestes e alvejaram-nas no sangue do Cordeiro. É por isso que estão diante do trono de Deus, servindo-o dia e noite em seu templo". Por isso, nós sabemos que existe um serviço litúrgico no templo celestial. O nosso é apenas uma reflexão pálida que mal se compara com o serviço litúrgico que acontece lá e este pessoal todo serve dia e noite no templo celestial.

Mas eles não têm permissão para fazer orações por nós, certo? Dá um tempo! Deus vai ficar zangado? Vai ficar ofendido? Claro que eles fazem orações por nós! Como é que eles servem? Veja no capítulo 8, 3: "Outro Anjo veio postar-se junto ao altar, com um turíbulo de ouro. Deram-lhe uma grande quantidade de incenso para que o oferecesse com as orações de todos os santos, sobre o altar de outro que está diante do trono".

Os santos de quem se fala aqui devem ser interpretados contextualmente como sendo os santos que foram martirizados e que agora servem no céu. Agora, nós podemos ter uma aplicação secundária que incluiria, é claro, também os santos terrestres; mas contextualmente aqui se fala dos anjos celestes. E o que eles estão fazendo? Rezando. E estas orações são oferecidas com incenso pelo anjo no altar de Deus, no altar de ouro que está diante do trono, que estava bem em frente ao Santo dos Santos no templo terrestre como no templo celeste. "E da mão do Anjo, a fumaça do incenso com as orações dos santos subiu diante de Deus".

E o que acontece? Deus em resposta às orações dos santos age. Ele chama os sacerdotes celestes para que peguem suas trombetas e se preparem para tocar. Isto desencadeia as sete trombetas que por sua vez desencadeiam todo tipo de ativitidade terrestre que justifica os santos e vinga seu sangue e derruba os orgulhos e presunçosos diante de Deus. Você percebe o poder do serviço litúrgico? As pessoas dizem: "Bem, é preciso se envolver". Eu digo: "Exatamente, precisamos nos envolver. Precisamos fazer realmente as coisas que mudariam as injustiças da terra a começar com um bom serviço litúrgico". Porque se você ler o Apocalipse e entender a mensagem, você vai ver que existe uma coisa acima de todas as outras que muda as más coisas. E é adorando a Deus com todo o seu coração, mente, alma e força.

Isto libera todas as coisas que o povo na terra necessita de Deus em resposta às orações dos santos. Não se discute. Não se debate. Não é demonstrado logicamente. É assumido e descrito graficamente. E o que nós rezamos? "Seja feita a vossa vontade assim na terra como no céu". Nosso serviço litúrgico é uma imitação do serviço celete. Nossa intercessão é uma imitação da intercessão deles. Mas como podemos fazer isso se não temos nenhuma idéia do que eles estão fazendo e eles não têm nenhuma idéia do que nós estamos fazendo? Isto não é comunhão e isto também não é o que o Apocalipse descreve.

Volte um pouquinho na Bíblia. Você pode ver isso no Apocalipse 5, 8: "...os vinte e quatro Anciãos prostraram-se diante do Cordeiro, cada um com uma cítara e taças de ouro cheias de incenso, que são as orações dos santos, cantando um cântico novo". Eles não só tocam instrumentos, mas eles cantam cânticos e eles dão louvores ao Cordeiro. Depois eles fazem orações para as pessoas que estão em necessidade. E o que faz Cristo depois de suas orações? Ele por acaso diz: "Hei pessoal, as minhas orações não são o suficiente? O fato de eu ser o Sumo Sacerdote não é o suficiente para todas as necessidades do meu povo na terra como no céu? Acabem logo com isso e relaxem"?

Não, ele não disse isso. O que ele faz? Versículo 10: "Deles fizeste, para nosso Deus, uma Realeza e Sacerdotes; e eles reinarão sobre a terra". O reinado deles se estende do céu para a terra. Cristo fez deles um reino de sacerdotes. Em outras palavras, o que Deus ofereceu no Monte Sinai, Exodo 19, 6 e que eles se recusaram e que depois Deus continuamente oferece através de Davi e Salomão, e eles recusam; Deus oferece através de Jesus e dos Apóstolos e Jesus aceita e estabelece, portanto, uma nova aliança baseada nesta aceitação. E através de seu poder, ele faz o que Adão, Noé, Abraão, Moisés e Davi juntos multiplicado por 100, jamais puderam fazer - um reino de sacerdotes, se recebermos na fé e cooperarmos com esta graça.

Nós somos um reino de sacerdotes. Isto enfraquece nosso Rei? Isto tira a autoridade sacerdotal de Jesus? Não. Isto manifesta-a. Como luz pura batendo num prisma mostra a beleza intrínsica oculta desta luz conforme os raios são refratados, você vê o que existe o tempo todo na luz mas não podia ver antes que fosse refratada no prisma. Esta é a beleza de Cristo, refratado pelos seus santos e suas orações de intercessão. E eles cantam a canção sobre o Cordeiro e ele falam sobre como ele recebeu o poder e a riqueza e a sabedoria e a força e a honra e a glória e o louvor. Mas o que faz Cristo com tudo isso? Ele se volta e dá isto à nós.

Eles têm tronos e coroas e o que eles fazem? Eles prostam suas coroas. Cristo as pega e as devolve a eles e diz: "Sentem-se nos tronos. Vocês são meus sacerdotes. Vocês são meus reis..." Pode-se ver isto no capítulo 4, 4: "vinte e quatro tonos, e neles assentavam-se vinte e quatro Anciãos, vestidos de branco e com coroas de ouro sobre a cabeça". Por que isso? Por que Cristo não é o suficiente? Não. Por que Cristo está longe? Claro que não. Pelo contrário, é porque estes santos confiam que a graça de Cristo é suficiente, a mesma graça que eles agora possuem como santos martirizados glorificados no céu.

Apocalipse 14, 13 diz tudo: "Ouvi então uma voz do céu, dizendo: 'Escreve: felizes os mortos, os que desde agora morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, que descansem de suas fadigas, pois suas obras os acompanham.'". Agora, nós não adoramos os santos benditos que foram martirizados e elevados e glorificados no céu. Nós não os adoramos. Na verdade, Apocalipse 19, 10 nos diz para não os adorarmos - onde o anjo aparece para João e João se prostra e o que ele diz? "Caí então a seus pés para adorá-lo, mas ele me disse: 'Não! Não o faças! Sou servo como tu e como teus irmãos que têm o testemunho de Jesus.'" Preste atenção, ouça: "É a Deus que deves adorar!" Este é o único que adoramos. E então o que fazemos? Porque nós adoramos a Deus e porque nós tentamos imitá-Lo, nós louvamos aqueles que Ele louvou. Nós honramos aqueles que Ele honra. É assim que funciona a aliança. Esta foi sempre a forma da aliança, como veremos.



Três Classes de Santos

Por todo o Apocalipse existem três classes de santos: os mártires, as virgens e os confessores, que são consistentemente mostrados como exemplo para nós. Por exemplo, Apocalipse 14, 4. No versículo 1 deste capítulo nos é dito sobre o número 144.000. As doze tribos de Israel todas doam 12.000 santos. Que tipo de santos? Nos é dito que eles cantam um cântico novo diante do trono do Cordeiro. É um cântico que ninguém podia aprender a não ser os 144.000 que foram resgatados da terra. Eu acho que deve ter sido um cântico judaico. Só os Judeus das 12 tribos de Israel é que podem cantar.

"Estes são os que não se contaminaram com mulheres pois são castos", diz a minha bíblia não-católica e nas notas de rodapé diz, "Grego: virgens". Então por que não traduzir usando "virgens"? O que são eles? Nós ousamos não dizer esta palavra muito alto, com muita frequência em nossa sociedade. Por quê? O intercurso sexual é errado? De forma alguma. É o que consuma a aliança matrimonial. É o que faz o sacramento legalmente indissolúvel. É o que traz uma nova vida, e nos tornamos co-criadores com Deus pela graça de Cristo. O intercurso é mal? Não, é bom. O casamento é mal? Não, é sagrado. É um sacramento na Igreja Católica. Ele confere a graça de Cristo ex opere operato.

Mas Deus reserva bençãos especiais para aqueles que renunciam bens terrenos que são muito bons por bens celestiais ainda melhores. 1 Corintios 7, 32: São Paulo diz, "Eu quisera que estivésseis isentos de preocupações. Quem não tem esposa, cuida das coisas do Senhor e do modo de agradar ao Senhor. Quem tem esposa, cuida das coisas do mundo e do modo de agradar à esposa, e fica dividido. Da mesma forma, a mulher não casada e a virgem cuidam das coisas do Senhor, a fim de serem santas de corpo e de espírito. Mas a mulher casada cuida das coisas do mundo; procura como agradar ao marido". Todas as pessoas casadas digam: "Amém".

Isto significa que não podemos servir o Senhor? Claro que não. Nós podemos servir o Senhor mas nós também temos que cuidar das coisas do mundo, temporárias e passageiras. Tudo bem. Deus usará estas coisas como meios de graça. Mas elas não são permanentes e nossas famílias aqui não são permanentes porque elas estão ligadas pelos laços da carne e sangue de Adão que terão que morrer e ressuscitar em Cristo e serem membros da família da Nova Aliança.

Isto significa que a familia é algo ruim? Não, é sagrada. Nós devemos ser sacerdotes em nossa igreja doméstica. Pais, abençoem seus filhos à noite antes deles dormirem. Cantem canções na mesa de jantar. Façam orações, eu desafio vocês a fazerem orações espontâneas de vez em quando. Isto não é um monopolio protestante. Nós podemos fazer orações tiradas de nosso coração de filhos de Deus e devemos fazê-las.

Mas São Paulo, o inspirado apostolo sem erros, está comunicando aqui o que Deus quer comunicar porque o Espírito Santo é o autor principal até mesmo destas palavras. "Digo-vos isto em vosso próprio interesse, não para vos armar cilada". Nos é permitido o casamento e ele é glorioso. "Mas para que façais o que é mais nobre e possais permanecer junto ao Senhor sem distração". E depois no versículo 38: "Portanto, procede bem aquele que casa a sua virgem; e aquele que não a casa, procede melhor ainda".

Um bom amigo meu, ex-católico e agora anti-católico me disse: "Bem, Paulo não quer dizer para a vida toda". Eu disse: "Ok, me mostra onde é que este caso se aplica". Nós olhamos e procuramos e olhamos de novo em vão. Então eu disse: "Sabe, quando se olha novamente em Apocalipse 14, 4, aqueles 144.000 virgens não eram virgens temporários. Deus faz de nós todos virgens temporários e faz de alguns virgens permanentes, mas no casamento todos nós devemos ser virgens, certo?" Não, isto não é o que a Biblia está dizendo. Nós colocamos palavras na boca de Cristo e na boca de São Paulo? Estas pessoas morreram virgens. Agora se alguém dissesse. "Bem, na Israel antiga não havia nenhuma tradição costumeira que exaltasse a virgindade". É muito triste dizer que entre os Fariseus isto é verdadeiro. Não havia tal costume. Mas você teria que pelo menos negar o que é obvio e evidente nos Manuscritos do Mar Morto e na comunidade dos Essênios de Qumram, porque eles louvavam a virgindade. Agora, se você for casado, você também pode ser um membro santo da comunidade. Flavius Josephus e Philo e outros Judeus, apesar de não serem Essênios; eles podem ter sido Fariseus, Saduceus, Zelotas; ainda assim, todos os outros grupos de Judeus sabiam que os Essênios eram os mais justos e santos.

Eram eles que louvavam a virgindade. Isto não é novidade. Maria se refere implicitamente a esta promessa de virgindade, quando ela diz: "Como é que vai ser isso, se eu eu não conheço homem algum?" O anjo poderia ter dito simplesmente: "Em alguns meses quando você se casar, vocês farão amor e vocês terão um filho". Quero dizer, ela não conhecia fatos básicos de anatomia e biologia? Como sempre disseram os primeiros Pais da Igreja, implícito naquele texto, o único sentido para ela não estar dizendo algo insensato, é ela, como os Essênios, estar entrando no casamento com um reconhecimento total da glória e santidade do matrimônio e do amor matrimonial, amor físico e sexual, mas com uma benção superior ainda maior se Deus conferisse a graça de viver virginalmente no casamento.

E é sobre isto que São Paulo fala em Corintios 7 quando ele diz: "Se seu ardor por sua noiva é muito grande" - literalmente a tradução seria "se seu ardor pela sua virgem". Algumas traduções dizem que é filha, outras que é noiva, será que é a irmã ou o quê, afinal? Bem, São Paulo estava dizendo algo que ele supõe que os cristãos de Corinto entendem claramente. E desde o começo as pessoas imitavam Maria e José, e até antes de Maria e José este costume era encontrado no judaismo entre os mais santos. Deve ser uma pílula dura de engolir para os americanos porque nós gostamos de fazer sexo de todas as maneiras diferentes possíveis. Esta é a melhor maneira de vender livros e filmes e o que quer que seja. Além do que sexo não é ruim mas é bom.

Sexo no matrimônio é sagrado. É o meio pelo qual a vida natural é co-criada com Deus. Mas existe algo ainda maior. Nós temos que fazer orações por nossos padres e religiosos, irmãos e irmãs. Eu não estou certo de que tenha existido uma cultura que tenha tão seriamente colocado-os à prova e em tentação. Nós temos que fazer orações para que eles, também, possam de alguma forma se unir aos 144.000 e nós também nos juntaremos a eles, porque junto com os 144.000, existem aqueles que lavaram suas vestes no sangue do Cordeiro, uma grande multidão que nenhum homem pode contar. E eles cantam e adoram o Cordeiro. Eles são sacerdotes e reis. Deus não mostra parcialidade. São Paulo diz a Timoteo: "Se com Cristo sofres, com Ele reinarás". Se sofreres. E são estes que vemos reinando com Cristo no Livro no Apocalipse.

É por isso que na Ladainha de Loretto, por exemplo, temos Nossa Senhora com que títulos? Rainha dos mártires, Rainha das virgens e Rainha dos confessores e depois, Rainha dos santos, rogai por nós. Isto é tirado do Apocalipse. Nós também podemos ver em Apocalipse 20, 4-6, a mesma idéia. "Feliz e santo aquele que foi martirizado. Eles estão sentados nos tronos celestes". O que mais? "Vi então tronos, e aos que neles se sentaram foi dado o poder de julgar".

Jesus Cristo é o verdadeiro juiz. Ele está sentado no grande trono branco que é descrito em Apocalipse 20, 11. Mas então Ele tem tronos auxiliares. Por quê? Porque Ele dá a eles o poder de julgar. São Paulo diz aos Corintios: "Não sabeis que julgaremos os anjos?" Eles estão sentado nos tronos com o poder divino de julgar confiado a eles. Eles executam o julgamento de Cristo para Sua glória; por Cristo, em Cristo e com Cristo.

Então deixem que eles julguem. Deixem que eles passem a sentença. Deixem que eles descubram que coisas precisam de julgamento. Deixem que eles saibam. Façam orações a eles e peçam pela intercessão deles no único mediador porque eles são os sacerdotes de Deus e de Cristo que nos é dito neste texto no versículo 6: "Eles serão sacerdotes de Deus e de Cristo, e com ele reinarão". Amém. Obrigado Jesus. Por quê? Porque o sacerdócio de Cristo não é o suficiente? Não, porque Cristo é um doador generoso e Ele dá uma participação a todos nós que cooperamos com esta graça.



Sugestões para conversas com não-católicos

Eu devo-lhes dizer que sempre que conversarem com não-católicos ou até mesmo alguns católicos confusos ou ex-católicos, vocês têm que alicerçar isto em Cristo. Vocês têm que colocar as raízes disso tudo em Cristo. É a vida Dele, é a graça Dele, é a santificacão Dele e na Sua beatitude que participamos. A razão pela qual os mortos são benditos em 14, 13, a razão pela qual os martires são benditos em 22, 14 é porque eles estão em Cristo; mas eles são benditos.

Quando Cristo vos abençoa, garantido o resto, você está abençoado! E é por isso que Nossa Senhora pode dizer em Lucas 1, 48: "Doravante as gerações todas me chamarão de bem-aventurada". Nós só estamos demonstrando que ela está certa e que tudo o que fazemos é nos juntar aos anjos porque, o que disseram os anjos? "Ave, cheia de graça, bendita és tu entre as mulheres". E quando clamamos a mãe de Deus, é praticamente o que Isabel diz: "A mãe do meu Senhor me visita".

Então por que o rosário é tão ofensivo? A primeira parte nada mais é do que a Escritura: "Ave-Maria, cheia de graça. O Senhor é convosco. Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto de vosso ventre, Jesus. Santa Maria," (porque Cristo a fez santa) "Mãe de Deus," (Isabel declarou que ela era mãe do Senhor,) "rogai por nós, pecadores," (o que estamos confessando? Estamos confessando nossa própria corrupção; quero dizer, a doutrina do pecado) "Rogai por nós, pecadores," (agora porque somos fracos e dependentes) "e na hora de nossa morte,"
(quando formos para a presença de Deus). Veja toda a boa teologia que existe aí.

Nós temos a doutrina do pecado. Temos a doutrina da salvação. Temos a doutrina da graça. Temos até mesmo a escatologia, a "hora de nossa morte". Quero dizer, raramente se encontra um parágrafo num livro de teologia que tenha tanta doutrina e passagens corretas. E tudo o que estamos fazendo é ecoar o anjo e tudo o que ele estava fazendo era ecoar Jesus porque tudo o que ele é, é um mensageiro de Deus, com a mensagem de Deus.

Nós bendizemos Deus que é bendito acima de todos e depois bendizemos aqueles que ele bendiz porque esta é a natureza da aliança. Sempre foi. Genesis 27,29 fala sobre a benção de Israel: "Que os povos te sirvam, que nações se prostrem diante de ti! Sê um senhor para teus irmãos, que se prostrem diante de ti os filhos de tua mãe! Maldito seja quem te amaldiçoar! Bendito seja quem te abençoar!" - esta foi a benção de Isaac sobre Israel.

É isto que fazemos ao venerar os santos. Nós bendizemos aqueles que Deus abençoou. "Bendito seja quem te abençoar". É esta a natureza da aliança nos Tempos Antigos e as bençãos não enfraquecem a Nova Aliança. Pelo contrário. Assim, se você é abençoado quando abençoa aqueles que Deus abençoou no passado, quanto mais você será quando bendizer aqueles que Deus abençoou em Cristo? É por fim a benção de Cristo.

Nós não fazemos orações para os santos ao invés de para Cristo. Nós rezamos através dos santos à Deus em Cristo. Mas você pode dizer isso de várias maneiras ou você pode ter significados secundários que podem estar corretos, mas por fim, os santos não atendem nossas orações. Eles ecoam nossas orações com profundidade, discernimento e amor maiores. "A oração fervorosa do justo tem grande poder!" Isto não é encontrado somente no Novo Testamento, mas é basicamente testemunhado por toda a Escritura. Não só os justos da terra mas os justos em geral, onde quer que estejam. Eles podem fazer orações e elas tem grande poder.

A palavra alemã para benção é "segnum". Ela é na verdade derivada do latim "signare", que quer dizer "fazer o sinal da cruz". A cruz é a fonte de todas as bençãos. Nós não tiramos o mérito da cruz quando bendizemos os santos que Cristo abençoa. Nós sustentamos a cruz. Nós exemplificamos a cruz. Exemplificamos a obra de Cristo. 2 Timoteo 2, 11-12: "Se com ele morremos, com ele viveremos. Se com ele sofremos, com ele reinaremos".

Nós imitamos Cristo. É este o chamado do cristão. Nós honramos aqueles que Cristo honra e da mesma forma. Este é a primeira e talvez a razão mais fundamental mas em segundo lugar, nós desejamos seguir o exemplo heróico deles ao imitarem Cristo. Eu sei, pois tenho visto muitas famílias onde se o primeiro filho é bom, os outros podem seguir seu exemplo. Eu sei por experiência própria que se o primeiro filho extravia, as chances são muito maiores de que os outros se extraviem, como aconteceu comigo. Graças a Deus, ele nos alcança não importa onde estamos ou quem somos ou o que fazemos, mas o fato é que os exemplos, especialmente os exemplos heróicos ajudam bastante.

Tudo o que fazemos é celebrar a obra de Cristo, as obras-primas de Cristo, especialmente quando se trata da Santíssima Virgem Maria. Adore a Deus e somente a Deus, mas venere, honre, bendiga aqueles que ele honra e aqueles que ele bendiz. Só estamos imitando Cristo e estamos somente nos ajudando e ajudando a outros a seguirem o exemplo heróico de Sua virtude e de Seu sacrifício.



Conclusão
Antes que eu termine, eu quero tirar uma espécie de tangente final. Talvez eu devesse tê-la feito ontem, mas eu falei bastante sobre Maria tanto hoje de manhã como ontem. Eu focalizei em Nossa Senhora ontem, então você pode pensar que eu não devesse focalizar nela nesta manhã, mas eu gosto de focalizar nela todo dia. Em particular existe uma questão que já surgiu, pelo menos implicitamente. Nós falamos sobre ela e a Igreja ensina a dulia, a veneração e a honra aos santos, mas para aquela que é a Rainha de todos os santos, devemos a hiperdulia, que não é a mesma coisa que latria, que é adoração.

Eles são finitos. Eles são criaturas. Eles estariam perdidos e mortos no pecado se não fosse pela graça de Cristo. Só Deus é infinito, eterno. Só Ele possui auto-existência. Eles têm existência. Ele é a própria existência. Jamais nos esqueçamos disto. Ajudemos outros perceberem a que jamais nos esquecemos disto e que deixamos esta distinção bem clara. E façamos de nossa adoração a Deus o melhor possível para que nossa dulia seja distinta de nossa latria.

Mas e sobre a virgindade perpétua de Maria? Nós falamos sobre Maria e hiperdulia. Falamos sobre a virtude da virgindade. Por que existe a doutrina da virgindade perpétua? Por que isto é definido "de fide" (=de fé) como algo que os católicos devem crer estar de acordo com a Igreja? Bem, por uma razão porque é verdade. Segundo, porque a Igreja sempre aceitou isto e a Igreja sempre ensinou isto. O Credo de Santo Epifanio, em 374, afirma: "Maria, sempre virgem". O Segundo Concílio de Constantinopla em 553 bem como o Concílio de Latrão em 649, também afirma: "Maria, sempre virgem". Santo Agostinho sempre insistiu nisso. Junto com Santo Agostinho, S, Jerônimo escreveu um livro sobre a Virgindade Perpétua da Santissima Virgem Maria em resposta a Helvidio, que em 380 foi a primeira pessoa nos registros verdadeiramente a negar a virgindade perpétua de Maria e a sugerir que os irmãos de Jesus eram irmãos de sangue e filhos de Maria.

S. Jeronimo nem mesmo queria escrever o livro. Ele achava Helvidio bastante esquisito. Ele disse, "isto é uma novidade maldosa e uma afronta ousada para a fé de todo o mundo". Lutero acreditava nela. Calvino afirmou-a e Zwinglio, todos eles, falaram de "Maria, sempre virgem" em seus escritos. Bem, então como é que se lida com as passagens bíblicas?

Façamos isto apenas brevemente. A irmandade de Cristo é provavelmente o maior obstáculo. Mateus 1, 25: "Mas não a conheceu até o dia em que ela deu à luz um filho". Eu já disse que a palavra "até" pode ser conjuntiva. O que eu quero dizer é que "até" nem sempre significa algo como: "Ela era virgem até depois de dar a luz um filho e depois ela deixou de ser virgem". Nem sempre significa isso. Por exemplo, 2Samuel 6, 23: "E Micol, filha de Saul, não teve filhos até o dia de sua morte"; obviamente não significa que ela teve gêmeos após o funeral. Deuteronomio 34, 6 fala sobre o enterro de Moisés, que aparentemente foi Deus quem fez: "e até hoje ninguém sabe onde é a sua sepultura". Isso não significa que quando o Deuteronômio foi escrito, eles a encontraram. Eles nuncam a acharam.

Assim, a tradução de Knox de Mateus 1, 25 é que ele não a conheceu em nenhum tempo antes dela dar a luz ao primogênito. Bom, e sobre a palavra "primogenito"? Isto não sugere que houve um segundo e um terceiro? Não, claro que não, e todo mundo que conhece o Antigo Testamento percebe isto porque primogenito em Exodo 13, 2 e Exodo 34 é na verdade um termo técnico para a criança que "inaugura o ventre materno". O primogenito é consagrado automaticamente ao Senhor. Mesmo se você tiver muitos outros, aquele primogênito é consagrado e é especial.

Bom, mas você pode dizer: "Não é natural ela não ter tido relações com José". Bem, não se ela fez uma promessa sagrada que aparentemente era um costume da época, até mesmo se fosse raro. Mas vamos continuar. "Muito bem, não é natural ser casada e não ter relações com seu parceiro, mas também não é natural conceber a segunda pessoa da Divindade em seu ventre e ter seu útero transformado no tabernáculo último e cósmico da salvação para todos os filhos de Deus. Para ser posto a parte para o propósito mais sagrado imaginável em toda a história da humanidade".

Quero dizer, nós não usamos a nossa melhor porcelana para fazer pic-nic no fundo do quintal, usamos? Portanto, se Deus usou este recipiente para o propósito mais sagrado imaginável ao homem, José deve ter tido um senso de decência sobre outros usos que não deixam de ser sagrados em si mesmos, da mesma forma que copos e pratos de plástico não são profanos, mas as coisas têm o seu lugar próprio. Não é natural dar a luz à Segunda Pessoa da Trindade, ensinar a andar, a falar e a rezar, o Deus que te criou. Não seria inatural, eu penso, se você se achar nesta situação, não seria improvável devotar-se tão completamente ao serviço de Deus nesta oportunidade tão absolutamente única, espetacular e estranha.

Não se trata somente de uma família normal. A Sagrada Família é um exemplo, mas não é uma família típica porque nem todas as pessoas têm por um filho ou um irmão o Logos eterno. Isto é único. Assim, o casamento deles também era único.

E sobre aqueles que eram chamados especificamente de irmãos de Jesus? Pegue por exemplo, Tiago. Tiago, nos é dito ser o irmão de Jesus. Mas espere um pouco, se você estudar a cena da cruz, você pode entender o que isto significa. Mateus 27, 56 fala de Maria ao pé da cruz que é a mãe de Tiago e de José. Marcos 15, 40, descreve Maria como a mãe de Tiago o Menor. E depois em João 19, 25 lemos sobre Maria, mãe de Jesus e no próximo parágrafo, "Maria mulher de Cleofas".

Fica óbvio quando se correlaciona estes três textos, Mateus 27, 56; Marcos 15, 40 e João 19, 25, que Maria, a mulher de Cleofas, diferente de Maria, a mãe de Jesus, é a mãe de Tiago. Mas só depois de ter correlacionado estes três textos. Alguém pode dizer: "Mas espere aí. Mateus 10, 3 descreve Tiago como filho de Alfeu", mas a grande maioria dos estudiosos diz que provavelmente Cleofas é o nome grego para o mesmo homem que é chamado de Alfeu, porque era bem típico ter um nome aramaico, como Alfeu, e ao mesmo tempo tomar um nome grego para as pessoas de origem grega em sua comunidade, como por exemplo Cleofas. Como Saulo, o fariseu; Saulo é o seu nome judeu. Deus não disse, "Eu vou mudar seu nome para Paulo"; este já era seu nome romano legal. Isto era comum naquela época.

Eu gostaria de sugerir que considerássemos João 19 no pé da cruz. Se Jesus tivesse outros irmãos, irmãos mais velhos, como em João 7 - um monte de pessoas sustenta o fato de que ele parece ter irmãos mais velhos - então a quem você acha que ele confiaria sua mãe? A João, o discipulo amado? E se você fizer um estudo mais aprofundado a este respeito, você irá descobrir que Tiago e João eram primos de Jesus, então o que Jesus estava fazendo era confiar sua mãe a um de seus primos, o discípulo amado. Pelo menos é isto o que incontáveis estudiosos têm sustentado. O que seria bastante natural se você não tivesse nenhum irmão de sangue mas tivesse primos. E na língua hebraica não existe palavra para primo. A palavra que é usada é irmão, não só para primos mas para sobrinhos também.

Temos exemplos em abundância. Genesis 14, 14: Lot é chamado de irmão de Abraão. Tecnicamente Abraão era tio de Lot. Genesis 29, 15 fala sobre Tio Labão como sendo irmão de Jacó. Na verdade, eu acho que o oposto, Jacó é irmão de Labão. É um relacionamento de sobrinho mas em hebraico não existe palavra que represente primo. Assim, o Antigo Testamento Grego não está traduzindo o "primo" de Genesis 14, 14, mas está transliterando-o para "adelphos" ou irmão, mesmo o tradutor sabendo que se está falando sobre um primo ou um sobrinho. E o que parece acontecer no Novo Testamento é algo semelhante. Ou seja, este costume foi transferido para os livros do Novo Testamento.

"Adelphos" é usado com frequencia para denotar aqueles que podemos provar serem primos, e não "anepsios" que não é usado com frequencia porque não estava de acordo com o costume hebraico. Nós podemos continuar olhando para outros exemplos e outras provas. Mas deixe-me dizer novamente que quando esta nova descoberta, quando esta doutrina novinha de que Jesus tinha irmãos e irmãs foi introduzida por Helvidio em 380, quase quatro séculos depois de Cristo, tudo o que S. Jerônimo podia dizer é que isto é uma novidade maldosa e uma afronta ousada para a fé de todo o mundo.

Nós, irmãos e irmãs, temos um péssimo caso de amnésia. Nós esquecemos aquilo que precisamos lembrar. E não só precisamos lembrar disto, precisamos viver e amar, partilhar e aumentar o nosso conhecimento a este respeito. Afinal, você pode dizer: "Eu não tenho tempo. Não tenho energia", mas veja bem, nós temos 60, 70, 80 anos, alguns 30, 40, 50. Que melhor maneira de usar nosso tempo do que usá-lo para conhecer a Santíssima Trindade e tudo o que Cristo tem feito para nos salvar e para fazer de nós sua família? Você consegue pensar em coisas melhores para fazer com o seu tempo? Eu não.

Temos que nos preparar para uma eternidade junto de Deus. Temos que aprender a amar a adoração. Temos que aprender a amar os santos. Temos que praticá-la para que quando cheguemos lá, isto não seja tão novo e estranho. O que será estranho e novo é contemplar a glória de Cristo em suas faces, mas os laços fraternais serão fortalecidos por esta vida nos preparando para aquela reunião grandiosa, para aquele grande retorno. Porque o céu é o nosso lar. A Santíssima Trindade é a primeira família e todos os santos são nossos irmãos e irmãs.

Assim, nós imitamos Cristo. Nos mantemos firmes na antiga fé da Igreja ao venerarmos os santos, especialmente a Santissima Virgem Maria.