terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Programa de Direitos Humanos exige mais diálogo, dizem estudiosos

O Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) contém diversas medidas que tem sido alvo de críticas.

De um lado, o governo sustenta a tese de que houve um amplo processo democrático ao longo da produção do texto do PNDH-3, que incorpora resoluções da 11ª Conferência Nacional de Direitos Humanos (realizada em Brasília entre 15 e 18 de dezembro de 2008), bem como propostas aprovadas em mais de 50 conferências nacionais temáticas promovidas desde 2003.

Em sua nota de esclarecimento, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos (Sedh) explica que mais de 14 mil pessoas estiveram envolvidas diretamente na elaboração do programa, além de consulta pública e a assinatura de 31 ministérios.

Em contrapartida, uma série de instituições e setores argumenta que propostas deste cunho só poderiam ter sido apresentadas pelo Poder Legislativo, bem como indica a necessidade de discussões mais aprofundadas, devido ao conteúdo delicado das propostas.

"O PNDH não é assunto para ser resolvido apenas pelos ministérios. Democracia participativa leva muito tempo", indica o sociólogo Pedro Ribeiro de Oliveira.

O jurista Ives Gandra Martins é ainda mais incisivo: "Uma sociedade de 190 milhões de habitantes não é representada por 14 mil amigos do rei. Por outro lado, quando eles colocam esses números, evidentemente nós sabemos que essas ONG's e outras organizações são quase todas montadas, monitoradas, organizadas por eles mesmos".

Ele também afirma que, mesmo o Decreto que aprova o PNDH-3 tendo o contorno de uma carta de intenções, o texto já possui um formato de comando jurídico. Assim, o Governo Federal teria extrapolado suas funções, ao exercer um papel próprio do Poder Legislativo.

"Um plano de Direitos Humanos tem que ser elaborado pelos representantes do povo. O que pretende esse PNDH-3 é uma ruptura institucional, é tirar o equilíbrio de poderes e dar a um único poder, o Executivo, a capacidade de reduzir à sua menor expressão todos os outros, permitindo que o povo seja manipulado permanentemente por plebiscitos e referendos em que, na verdade, não se discute nada com profundidade", defende.


Manifestação dos bispos

Mais de 65 bispos brasileiros, reunidos para um curso de atualização pastoral no Rio de Janeiro, publicaram uma nota no dia 28 de janeiro.

"Impelidos por nosso dever pastoral como Bispos católicos, [...] nos vemos no dever de manifestar publicamente nossa rejeição a determinados pontos deste Programa. Há propostas que banalizam a vida, descaracterizam a instituição familiar do matrimônio, cerceiam a liberdade de expressão na imprensa, reduzem as garantias jurídicas da propriedade privada, limitam o exercício do poder judiciário, como ainda correm o perigo de reacendar conflitos sociais já pacificados com a lei da anistia. Estas propostas constituem, portanto, ameaça à própria paz social", defendem.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), através de uma Declaração oficial de 15 de janeiro, reconhece que o Programa contém "elementos de consenso que podem e devem ser implementados imediatamente. Entretanto, ele contém elementos de dissenso que requerem tempo para o exercício do diálogo, sem o qual não se construirá a sonhada democracia participativa, onde os direitos sejam respeitados e os deveres observados".

Mais adiante, os bispos garantem: "A CNBB reafirma sua posição, muitas vezes manifestada, em defesa da vida e da família, e contrária à descriminalização do aborto, ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e o direito de adoção de crianças por casais homoafetivos. Rejeita, também, a criação de 'mecanismos para impedir a ostentação de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos da União', pois considera que tal medida intolerante pretende ignorar nossas raízes históricas".

Na tarde desta terça-feira, 2, o ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos (Sedh), Paulo Vanucchi, se encontrará com o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Dimas Lara Barbosa, para discutir o programa.


O que é o PNDH-3?

O Programa foi apresentado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos (Sedh) da Presidência da República em 21 de dezembro de 2009; é visto como uma ação integrada de governo e política de Estado, que não deve ter sobressaltos com a alternância de poder.

Estão previstas mais de 500 ações programáticas em diversas áreas, elencadas em um texto com mais de 200 páginas. O documento é estruturado em seis eixos orientadores, subdivididos em 25 diretrizes, 82 objetivos estratégicos e 521 ações programáticas.

A primeira versão do Programa (PNDH-1) foi lançada em 1996, com especial ênfase em direitos civis e políticos. Em 2002, o texto foi revisto e publicado o PNDH-2, que destacou direitos econômicos, sociais e culturais. A revisão agora proposta buscaria tratar de forma integrada múltiplas dimensões dos Direitos Humanos.